O segundo maior desastre nuclear da História não foi o suficiente para que os governos do mundo todo desistissem dessa fonte de energia cara, suja e perigosa

Em frente às usinas nucleares de Angra dos Reis (RJ), ativistas protestam contra os investimentos do governo brasileiro para construir Angra 3.

Onde você estava em 11 de março de 2011? No Japão, um terremoto, seguido de um tsunami mudava para sempre o país. Os abalos sísmicos causaram o colapso de reatores da usina nuclear de Fukushima, liberando radiação e contaminando os arredores da cidade. Hoje, cinco anos depois, ainda há muitos vestígios dessa tragédia.

Todos os dias, chegam aos mares japoneses 300 toneladas de água com algum nível de contaminação por radiação, como mostra um estudo do Greenpeace Japão, já admitido pelo governo. E, atualmente, mais de 100 mil pessoas ainda estão longe de suas casas. Elas não podem voltar ao local do desastre por conta dos altos índices de radioatividade. E não sabem se algum dia poderão.

Os casos de câncer de tireoide cresceram muito entre a população que morava perto da usina. E há efeitos colaterais não tão óbvios: essas pessoas também sofreram – e sofrem – preconceito por serem vistas como “contaminadas”. O índice de depressão entre elas é mais alto do que no resto da população japonesa e há muitos casos de suicídio.

Os riscos que uma usina nuclear, como a de Fukushima, poderia trazer já eram conhecidos por nós desde o acidente nuclear de Chernobyl, em 1986. E deveríamos ter aprendido a lição. Ainda que representantes do setor e alguns governos digam que as usinas nucleares são seguras, fatos mostram o contrário – e nem estamos falando de Fukushima e Chernobyl.

Entre 1946 e 2013, foram 174 os acidentes e incidentes em usinas nucleares em vários países. E, o mais assustador: temos 50% de chance de ver um novo acidente como o de Chernobyl nos próximos 27 anos. E de presenciar um da proporção de de Fukushima nos próximos 50 anos.

Com tantas tecnologias que já temos hoje, provando que é possível gerar energia a partir de fontes limpas, renováveis e seguras, não há razão para que o mundo continue investindo em nucleares. Depois do acidente no Japão, a Alemanha tomou uma atitude exemplar: divulgou planos eliminando gradualmente a energia nuclear de suas matrizes energéticas e hoje é o campeão em energia solar.

O próprio Japão já está investindo mais em fontes renováveis. Hoje, cinco anos depois do desastre nuclear, é o segundo maior mercado de energia solar do mundo. Entre 2012 e 2015, instalou 19 GW em painéis solares. Ainda assim, o governo japonês já religou algumas usinas nucleares e mostra que ainda não está pronto para fazer a revolução energética, apesar da chance que teve.

Enquanto isso, no Brasil

Nosso país segue a passos lentos e planeja ter até 2035 apenas 3,5 GW de energia solar, mesmo estando em uma das regiões com melhor incidência e potencial para aproveitar a fonte fotovoltaica. E, para piorar, o governo continua investindo na perigosa nuclear, ignorando os acidentes que já aconteceram em outros locais.

A usina de Angra 3 está em obra e já é um monumento bilionário. Prometida para 2012, seu custo passou de R$ 7 bilhões para R$ 14,9, e sua entrega está prevista para 2018 – embora o governo agora fale em 2021 . As usinas que a precederam, Angra 1 e Angra 2, custaram mais de US$ 16 bilhões e têm capacidade instalada de 2 GW. Isso equivalente a menos de 2% de todo o parque gerador brasileiro.

Essas duas usinas correm o risco de terem a vida útil encurtada e serem desligadas em alguns anos. Seus depósitos temporários estão quase saturados de lixo radioativo. Não há no mundo lugar de armazenamento permanente para este fim. O custo? Para resolver a destinação destes dejetos atômicos, mais de R$ 1 bilhão do nosso dinheiro terá que ser desembolsado.

O Brasil continua insistindo em fontes de muito impacto social e ambiental, mesmo podendo gerar energia eólica e solar suficientes para abastecer todo o país. Mas quem sabe o Sol não leve alguma iluminação para a visão obtusa dos nossos governantes e os inspire para criar as condições favoráveis para as energias renováveis – tanto de políticas públicas, quanto de mercado.  E quem sabe no futuro, não olhemos para a História lamentando os acidentes nucleares, mas vendo que soubemos aproveitar a solução, que estava bem perto de nós.

(*Thiago Almeida é da Campanha de Clima e Energia do Greenpeace Brasil)