Apesar da Shell ter desistido de explorar o Ártico, a região ainda não está a salvo das grandes empresas de petróleo e da pesca industrial

Há 3 anos o Greenpeace trabalha para impedir a exploração de petróleo no Ártico e, finalmente, na semana passada, a Shell declarou que está deixando a região por tempo indeterminado.

Essa ainda não é uma conquista completa. A ONG continua pedindo a proibição da pesca industrial predatória na área e que ninguém mais tente explorar petróleo naqueles mares gelados. Pede-se que o Polo Norte seja transformado em um santuário global, garantindo a proteção da casa dos ursos polares e de muitos outros animais que lá vivem.

Em maio deste ano, ativistas em caiaques cercaram a Polar Pioneer, plataforma de perfuração da Shell, para que ela não deixasse Seattle, nos Estados Unidos, e partisse em direção ao Ártico. (© N. Scott Trimble / Greenpeace)

Mas o fato da conquista ser parcial não a torna menos notável. Mais de 7 milhões de pessoas em todo o mundo podem se orgulhar de apoiar a campanha Salve o Ártico e de ter mostrado à Shelll o poder de um povo unido em nome de um ideal!

Até aqui, o movimento Salve o Ártico teve tantos grandes momentos que é difícil escolher alguns para destacar, mas ainda assim vale tentar.

Lembrar para continuar

Em dezembro de 2011, apesar de diversos especialistas apontarem os perigos dos planos da empresa, a Shell lançou uma campanha publicitária para convencer o mundo de que é seguro explorar petróleo no mar Ártico. “A Shell está pronta para o Ártico”, era o slogan da campanha, mas a verdade é que nem a Shell nem nenhuma outra empresa está.

“Essa é a pior jogada de marketing na história das piores jogadas de marketing. Vamos com tudo”, diz uma das paródias do anúncio publicitário da Shell. (© Greenpeace)

Sabendo disso, o Greenpeace não só parodiou os anúncios da empresa, como convidou as pessoas a se juntarem ao movimento batizado de Salve o Ártico. Tantas aceitaram que, no primeiro mês, já eram contabilizados mais de 1 milhão de pessoas ao lado da ONG!

Dois meses depois, em fevereiro de 2012, a atriz Lucy Lawless aceitou esse convite. Juntamente com mais seis ativistas, a intérprete de “Xena – A Princesa Guerreira”, escalou uma torre de perfuração da Shell, levando com ela um banner com os escritos “Pare, Shell!” e “Salve o Ártico”.

Durante a Rio+20, diante do Corcovado, balão em forma de urso polar lembra a urgência de salvar o Ártico. (© Greenpeace / Marizilda Cruppe)

Em junho do mesmo ano o Greenpeace aproveitou a Rio+20 para pedir à ONU que faça do Ártico um santuário global. A ideia é que o órgão declare a área fora dos limites de exploração e a proteja da extração de petróleo em alto mar.

Apesar da sua campanha publicitária, a Shell não conseguia esconder o quão ruins eram os seus planos. Em julho, a empresa admitiu que, em caso de vazamento, não teria como recuperar 90% do petróleo que derramasse, como lhe era exigido. Era mais importante do que nunca impedir seus planos!

No fim de 2012, uma série de falhas começou a aparecer nos supostamente seguros planos da Shell. Em novembro, a Guarda Costeira dos EUA deteve a Noble Discoverer, uma das plataformas da empresa, devido a graves problemas de segurança. Durante um teste, o equipamento da Shell que deveria conter um vazamento no Ártico foi “esmagado como uma lata de cerveja”, segundo relatório.

Como se isso não bastasse, na noite de ano novo a plataforma de perfuração Kulluk encalhou após ser arrastada por um ciclone. Com esses enormes erros estampando as capas dos jornais, o mundo começava a ficar mais atento para o assunto.

A “Bandeira Para o Futuro” tremulando no extremo norte do planeta. (© Christian Åslund / Greenpeace)

Em abril de 2013, o Greenpeace foi ao Polo Norte e fincou ali uma bandeira do movimento Salve o Ártico, criada por uma menina de 13 anos, que vivia na Malasia e ganhou uma competição mundial promovida pela ONG. A “Bandeira Para o Futuro” trazia a assinatura de mais 2,7 milhões de protetores, que exigiam que o Ártico fosse transformado em um santuário global.

Já em agosto de 2013, milhões de pessoas assistiram ao vivo os banners da campanha Salve o Ártico substituirem os da Shell, durante o Grand Prix da Fórmula 1, que a petrolífera estava patrocinando. Na época, o vídeo mostrando o momento foi retirado do YouTube, mas isso só fez com que os protetores do Ártico o compartilhassem mais e mais, até que ele atingisse milhões de visualizações.

Indiscutivelmente, o momento mais dramático da campanha Salve o Ártico foi quando as autoridades russas prenderam 30 dos ativistas do Greenpeace, que protestavam contra os planos da petrolífera Gazprom, estatal russa, que também pretendia explorar a região. Depois de mais de dois meses presos, as autoridades cederam aos protestos dos milhões de pessoas em todo mundo, anistiando os ativistas.

A resistência seguiu firme. No início de 2014, a Shell anunciou que não exploraria petróleo no Ártico naquele ano. A justificativa era a enorme queda de 71% nos lucros da empresa e uma decisão judicial que questionava a legalidade de suas locações de perfuração. Um representante da Shell disse que os planos estavam “sob revisão”, mas ainda era muito cedo para comemorar.

Cidadãos da Legolândia vão às ruas em São Paulo para protestar contra a parceria da LEGO com a Shell. (© Fábio Nascimento / Greenpeace)

Em julho de 2014, devido a parceria da Lego com a Shell, os consumidores mostraram que não aceitariam empresas que se associassem com quem ousa pensar em explorar o Ártico. O Greenpeace fez uma paródia do anúncio da empresa que foi assistida milhões de vezes. Posteriormente, a Lego anunciou que não renovaria a parceria com a Shell se a petrolífera insistisse nos seus planos de explorar o Ártico.

Mais de um ano depois, em agosto de 2015, a Shell recebeu do governo dos Estados Unidos a licença final para explorar as águas do Ártico, apesar de nesse momento já haver 7 milhões de pessoas pedindo que ele não autorizasse isso.

A artista e ativista indígena Audrey Siegl, do povo Musqueam, encara a Polar Pioneer (© Keri Coles / Greenpeace)

Como os pedidos foram ignorados, o Greenpeace bloqueou os caminhos da Shell, que partia em direção ao Ártico. Primeiro, no meio do Oceano Pacífico, seis escaladores saltaram para uma plataforma de petróleo da empresa. Em seguida, ativistas em caiaques protestaram, enquanto uma sonda de perfuração da Shell deixava Seattle, nos Estados Unidos, em direção ao Ártico. Por fim, a ativista Audrey Siegel se colocou na frente de um navio para atrasar a viagem dele rumo a região. Cada minuto de atraso aos navios da Shell era um minuto a mais de segurança para toda a vida que habita o Ártico.

Nesse momento, um time de estrelas veio brilhar ao lado do Greenpeace e vestiu a camisa pelo Ártico. Mais de 60 celebridades foram fotografadas com a camiseta da campanha, entre elas Maisie Williams (a Arya Stark, de Game of Thrones), Chris Martin (vocalista da banda Coldplay), o ator Ian McKellen, o músico Ozzy Osbourne e a modelo Pamela Anderson.

Ativistas se penduram embaixo de ponte em Portland, nos Estados Unidos, para impedir que navio da Shell rume para o Ártico. (© Steve Dipaola / Greenpeace)

Quando um dos navios da Shell sofreu um dano e precisou ser levado para Portland, para reparos, 13 ativistas se penduraram embaixo de uma ponte, para impedir que ele voltasse ao Ártico. Apesar de em um primeiro momento o navio ter dado meia-volta, posteriormente os ativistas foram retirados e a Shell partiu para a região, deixando milhões temendo um catastrófico derramamento de petróleo no Ártico.

No Reino Unido, durante todos os dias de agosto, o Greenpeace fez um protesto musical do lado de fora da sede da Shell e só paramos para que, em setembro, mais alguém pudesse protestar. Já que a Shell invadiu a casa dos ursos polares, um representante da espécie foi até a sede da empresa para exigir que ela saísse de lá. O gigante boneco de uma ursa polar foi colocado em frente ao prédio durante a noite, com a promessa de ali ser mantido até que as exigências de Aurora – como a ursa foi batizada – fossem atendidas.

E então, na semana passada, a Shell surpreendeu (e aliviou) o mundo ao anunciar que finalmente estava deixando o Ártico. De acordo com o jornal The Guardian, além do aumento dos custos da exploração, outra das razões para a decisão da empresa foi a intensidade dos protestos públicos contra a perfuração, pois a Shell teme que eles possam manchar ainda mais a sua reputação.

Conforme os anos foram passando e os protestos se acumulando, parece que a maré virou. Por mais que no início parecesse difícil parar a exploração daquela área, a cada um que se uniu ao Greenpeace, o movimento Salve o Ártico ganhou mais força, o que garantiu essa conquista.

Resistir é preciso

Como já foi dito, essa ainda não é uma conquista completa. O Greenpeace só se dará por satisfeito quando o Ártico for declarado um santuário global. Porém, a ONG tem certeza de que, com a ajuda das mais de 7 milhões de pessoas que já resistem ao seu lado e das outras tantas milhões que ainda se juntarão a ela, um dia ainda poderá comemorar – aí sim, em tom de plena vitória! – e dizer orgulhosamente que o Ártico foi salvo.

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