Neste 22 de abril, dia em que se comemora o Descobrimento do Brasil – e três dias depois da data que celebra o Dia do Índio – os brasileiros se perguntam: o Brasil foi de fato descoberto ou invadido? E questionam se ainda é possível a construção de um país mais justo, que honre os direitos de todos os seus habitantes, incluindo os mais antigos e tradicionais ocupantes dessa Terra Brasilis.

Depois de séculos de opressão, na Constituinte de 1988, o Congresso Nacional brindou os povos indígenas com o reconhecimento do direito originário a seus territórios – isto é, um direito que já existia mesmo antes da adoção da lei em si. Entretanto, hoje, mais de duas décadas depois, o mesmo Congresso está analisando propostas e projetos, como a PEC-215, o PLP-227 e o PL-1610, que, se aprovados, enfraquecerão os direitos desses povos de ocuparem plenamente suas terras Brasil afora.

Contra tamanho retrocesso e em apoio a todas as causas da Mobilização Nacional Indígena, um grupo de artistas lançou hoje a campanha Tamuaté-aki, para cobrar dos parlamentares brasileiros mais respeito aos direitos conquistados democraticamente pelos mais de 900 mil indígenas de mais de 300 povos no Brasil, além das dezenas de grupos em situação de isolamento voluntário que evitam o contato com a sociedade.

Assista ao vídeo de divulgação da campanha:

 

A petição pública da campanha tem a intenção, em pleno período pré-eleitoral, de pedir a todos os deputados e senadores que demonstrem seu apoio aos índios e sua oposição a qualquer proposta que vise desconstruir os direitos desses povos consagrados na Constituição Federal. Com a iniciativa individual de cada cidadão, o Parlamento brasileiro pode, mais uma vez, garantir que o Brasil seja um país mais justo, mais diverso e mais livre, para todos os povos.

Em algumas regiões do país, quase tudo o que sobrou da cobertura vegetal nativa se encontra no interior das terras indígenas e das unidades de conservação. Em uma década – entre 1998 e 2009 –, somente na Amazônia, o desmatamento dentro de áreas protegidas foi de 1,22 milhões de hectares, segundo relatório Áreas Protegidas na Amazônia Brasileira, Avanços e Desafios, produzido pelo Imazon e ISA em 2011.

Dentre elas, as terras indígenas apresentaram o menor percentual de perda de cobertura florestal: 1,5% do total de suas áreas foram desmatadas. E isso só pode representar uma coisa: defender Terra Indígena é defender a floresta. 

Esse dado comprova que a diversidade sociocultural dos povos tradicionais caracteriza um patrimônio da sociedade brasileira como um todo, e por isso merece a atenção particular de cada um. A demarcação dos territórios indígenas, hoje paralisada pelo Executivo e ameaçada pelo Congresso, é condição básica de sobrevivência para essas populações e, portanto, para uma herança que é de todos.

Minuta do atraso

Enquanto a sociedade se mobiliza, o governo anda para trás. O Ministério da Justiça, órgão que hoje possui a atribuição de analisar os pedidos de demarcação de terras indígenas, divulgou há algumas semanas, uma Minuta de Proposta para promover alterações no procedimento demarcatório dessas áreas.

Com o documento, o ministro José Eduardo Cardozo tenta reavivar, 50 anos depois, mecanismos da ditadura militar para a demarcação de territórios tradicionais. A proposta do Ministério contraria decisões recentes, inclusive tomadas pela Corte Suprema do país, o STF, caso do julgamento sobre a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, entre outros.

A minuta também permite a interferência de grupos contrários à demarcação desde os primeiros momentos do procedimento de identificação e delimitação das terras indígenas, inviabilizando até mesmo o trabalho de campo dos profissionais técnicos. 

Contra mais esse retrocesso, dessa vez vindo diretamente do Executivo, organizações indígenas e indigenistas que participam da Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI) divulgaram um parecer, no último dia 08 de abril, em que analisam a proposta e sintetizam nove principais conclusões, sendo a última delas um recado claro para o governo federal:

“Uma eventual publicação da Portaria em questão reforçará compreensão, por parte dos povos indígenas, organizações de apoio aos povos e da sociedade em geral de que o Governo Dilma é claramente anti-indígena, aliado de primeira hora dos ruralistas, alinhado aos interesses do poder econômico nacional e transnacional, notoriamente do agronegócio, e obstinado por um modelo de desenvolvimento neocolonizador, usurpador de territórios, etnocida e ecocida”.

Isso talvez responda à pergunta inicial do texto. Ou precisa desenhar?