Depois de serem chamados publicamente de "tudo que não presta", uma comitiva de quarenta indígenas Guarani, Guarani-Kaiowá e Terena, além de representantes quilombolas, protocolaram hoje, na sede da Procuradoria Geral da República (PGR), em Brasília, uma representação contra os deputados federais gaúchos Luiz Carlos Heinze (PP-RS) e Alceu Moreira (PMDB-RS). O documento, assinado por diversas organizações indígenas e da sociedade civil, solicita que os parlamentares sejam investigados por crimes previstos no Código Penal, como incitação pública ao crime, apologia ao crime ou criminoso, formação de quadrilha ou bando e racismo ou injúria qualificada.

A ação foi baseada em declarações gravadas em dois vídeos, divulgados pelas redes sociais nas últimas semanas, em que os deputados proferem discursos que ferem a ética parlamentar, incitando os agricultores à violência e fazendo declarações preconceituosas.

Segundo Lindomar Terena, liderança do Mato Grosso do Sul e coordenador nacional da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), autoridades constituídas não podem agir de modo preconceituoso contra indígenas e outras minorias do povo brasileiro.

“No nosso entendimento, esta atitude viola nossos direitos. Ao invés de incitar a violência dos pequenos produtores contra os indígenas, estes deputados têm a obrigação de apresentar soluções para resolver os impasses. Eles devem exigir o cumprimento da lei, que determina a demarcação de todas as terras indígenas, e não tentar mudar a lei para o benefício próprio e de alguns poucos privilegiados. Isso nós não vamos permitir”, garantiu.

Após ampla repercussão negativa de sua fala em vídeo gravado durante audiência pública com trabalhadores rurais em Vicente Dutra, o deputado Heinze afirmou que suas palavras foram “força de expressão”. Uma outra gravação, no entanto, feita durante o chamado Leilão da Resistência, realizado no dia 7 de dezembro em Campo Grande (MS), evidencia que sua fala não foi um deslize, como ele quis dar a entender, mas sim um discurso discriminatório premeditado e recorrente.

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Assinam a representação as seguintes organizações indígenas: Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpinsul), Articulação dos Povos Indígenas do Pantanal (Arpipan), Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia (Coiab), Conselho Aty Guassu Guarani Kaiowá e o Conselho do Povo Terena.

Além delas, também assinam: o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), o Centro de Trabalho Indigenista (CTI), o Instituto Socioambiental (ISA), o Greenpeace e a Coordenação Nacional das Comunidades Quilombolas (Conaq).

“Em um momento em que as tensões e conflitos no campo já estão exacerbados, discursos que incentivam ainda mais violência não contribuem para a solução do problema, gerando ainda mais caos e desinformação. Por trás de declarações como essas se escondem os interesses de grupos minoritários de poderosa influência política e econômica, que querem se apropriar da riqueza natural contida nas terras indígenas, que só existem porque são preservadas pelos índios. Todos que defendem a democracia e os direitos humanos fundamentais devem se posicionar a favor do direito territorial dos povos tradicionais, garantido pela Constituição Federal”, afirma Tica Minami, coordenadora da Campanha Amazônia do Greenpeace.

Após serem recebidos na Procuradoria Geral, os indígenas se reuniram também com a coordenadora da 6a Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, Deborah Duprat, e se dirigiram à sede da Advocacia-Geral da União (AGU) para entregar um documento pedindo a revogação da Portaria 303 e realizar uma vigília em protesto contra a medida.