O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (Ibama), com o apoio da Polícia Federal, fechou hoje, às
9 da manhã, o terminal graneleiro da multinacional norte-americana
Cargill em Santarém, no oeste do Pará. A ação é resultado do pedido
do Ministério Público Federal (MPF) do Pará de
"fiscalização e paralisação imediata das atividades do porto, além
de autuação da empresa por operação irregular" e foi confirmada
no final do dia de ontem pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da 1a
Região.
A pedido do MPF, o desembargador federal do TRF da
1a Região, Souza Prudente, ordenou o cumprimento integral da
decisão de 2000 que suspendeu as licenças de funcionamento do porto
da Cargill em Santarém. O terminal graneleiro desobedece às leis
brasileiras que exigem a realização de Estudo de Impacto Ambiental
(EIA) para empreendimentos desse porte. De acordo com o MPF, "a
ordem encerra a pretensão da multinacional de desobedecer a
liminar, impede suas atividades na região e garante a elaboração de
Estudos de Impacto Ambiental para o funcionamento do terminal
graneleiro".
Para o procurador da República em Santarém, Felipe Fritz Braga,
"a decisão é histórica e muda o paradigma de ausência de governança
na região".
"A paralisação das atividades do porto da Cargill coroa a luta
de muitos anos das comunidades locais de Santarém e daqueles que
combatem a expansão da soja na Amazônia. A soja e outros produtos
do agronegócio são vetores fundamentais do desmatamento, que ameaça
a biodiversidade e provoca mudanças climáticas", disse Tatiana de
Carvalho, da campanha do Greenpeace pela proteção da Amazônia.
Segundo Tatiana, a Justiça está dando uma indicação clara de que
os grandes empreendimentos do agronegócio não podem mais se
esquivar de atender a legislação brasileira. "Confiamos que a
Cargill respeitará a decisão judicial fazendo (e fará) um amplo
estudo de impacto ambiental (EIA) que resulte em medidas concretas
para minimizar os danos ambientais provocados por seu porto e pela
expansão da soja em toda a região. Isso será uma forma de
demonstrar o compromisso da empresa com a moratória no desmatamento
anunciada pelo setor da soja no ano passado".
Inicialmente previsto para ser concluído no último dia 12, o
procedimento de fiscalização teve seu prazo estendido pelo MPF até
hoje a pedido do próprio Ibama. Desde 2000, o Ministério Público
vem travando uma verdadeira batalha judicial para que a Cargill
realize os Estudos de Impacto Ambiental.
Em vez de adequar suas operações de exportação de soja às leis
ambientais, a empresa preferiu explorar as brechas da legislação
brasileira e ganhar tempo, através de longa batalha judicial, para
construir e operar o seu terminal em Santarém.
Desde 2003, o Greenpeace apóia a luta das
comunidades locais de Santarém e defende que a Cargill realize
amplo Estudo de Impacto Ambiental em toda a região afetada pela
soja, para continuar operando. Em 2006, a organização ambientalista
publicou extensa investigação dos impactos negativos do avanço da
soja na Amazônia. O relatório
"Comendo a Amazônia" revela como a demanda mundial por soja
produzida na região tem alimentado o desmatamento da maior floresta
tropical do planeta. Em maio do mesmo ano, o Greenpeace bloqueou o
porto da Cargill com o navio Arctic Sunrise.
"É importante ressaltar o esforço contínuo do trabalho do
Ministério Público Federal que, desde o início do processo defende
o uso racional dos recursos naturais e vem se firmando como uma
grande força de governança na região", declarou o coordenador da
campanha Amazônia, do Greenpeace, Paulo Adario.
"Nós, do movimento social de Santarém, simplesmente sentimos a
justiça se realizar, finalmente, em defesa da Amazônia, de seu povo
e de seu ecossistema", disse Edilberto Sena, da Frente da Defesa da
Amazônia. "Esperamos que o EIA-Rima de fato expresse a verdade
sobre os impacto ambientais que o porto trouxe".
Lei da mordaça
Em uma última tentativa de adiar o embargo do porto, a Cargill
impetrou no último dia 07 de março um mandado de segurança para
tentar impedir o Ministério Público Federal de agir ou divulgar
atos para o fechamento do terminal graneleiro em Santarém. Com
isso, a Cargill tentava impedir a fiscalização do Ibama e o
conseqüente embargo do porto. O juiz federal em Santarém, Francisco
de Assis Garcês Castro Júnior, indeferiu os pedidos da empresa uma
semana depois.
Entenda o caso:
2000 - O MPF ajuiza Ação Civil Pública contra a Cargill e
a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente para que sejam
paralisadas as obras do terminal e elaborado Eia-Rima. No mesmo ano
o juiz federal Dimis da Costa Braga concede liminar cancelando as
autorizações para o porto. A Cargill ajuíza recursos e obtém efeito
suspensivo, iniciando as obras mesmo com a questão judicial
irresolvida.
2003 - O terminal graneleiro começa a operar. Os dois
primeiros recursos da Cargill contra a liminar da justiça são
derrubados no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília.
A empresa ajuiza outros dois recursos.
2004 - Sai a sentença do processo principal, condenando a
empresa a fazer Eia-Rima. A Cargill ajuiza apelação cível e a
decisão fica suspensa até apreciação pelo TRF. Enquanto isso, os
outros recursos contra a liminar de 2000 são negados pelos
desembargadores federais.
2005 - Os advogados da empresa ajuizam outros dois
recursos, para serem enviados às instâncias superiores (Superior
Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal).
2006 - Os últimos recursos são negados e nem chegam ao
STJ ou ao STF. As decisões publicadas só poderiam ser questionadas
até fevereiro, o que a empresa não faz.
2007 - Em janeiro o MPF é notificado do trânsito em
julgado do processo e requisita ao Ibama uma inspeção no terminal,
para verificação das licenças ambientais e consequente embargo de
atividades. A Cargill tenta evitar novamente o Eia-Rima ajuizando
mandado de segurança para impedir a fiscalização. A justiça
extingue o processo.
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