Tucumã, estado do Pará - 25 de outubro de 2001

Notícia - 24 - out - 2001

Hoje não foi um bom dia para voar. Quando saímos de Belém, o vento estava forte e as nuvens formavam um tapete cinza sob o avião. As três aeronaves Cessna deixaram o aeroporto ao mesmo tempo, mas o avião em que eu estava não conseguiu chegar à cidade de Tucumã na primeira tentativa. Havia uma camada densa de nuvens cobrindo a Serra dos Carajás, cadeia de montanhas que, em más condições do tempo, se torna invisível para olhos não-acostumados. Nós tivemos de voltar e esperar em Marabá durante quatro horas até que o céu clareasse um pouco e tivessemos certeza de poder pousar em Tucumã.

Sobrevoar o sul do Pará é uma experiência surpreendente, especialmente se você já esteve em outras partes da Amazônia. Tudo o que se pode ver são fazendas atrás de fazendas, grandes campos vazios com estradas ligando às cidades mais próximas, e blocos de floresta deixados aqui e ali. A única parte de floresta intacta fica dentro dos territórios indígenas. Do alto, também se pode ver pontos brancos se mexendo - são vacas. Só na região de Tucumã, há cerca de 1,5 milhão cabeças de gado.

Nós sobrevoamos o Lago Tucuruí, formado em consequência da construção da hidrelétrica de Tucuruí. Uma grande área de floresta foi inundada para concentrar água suficiente para alimentar a hidrelétrica. Tudo o que se vê do céu são árvores mortas boiando na água como espinhos pretos. Mais de 80% da energia gerada em Tucuruí é consumida pela Alcoa e pela Alunorte, duas produtoras de alumínio localizadas no estado do Pará. As duas companhias exportam a maior parte de sua produção para o Canadá e o Japão. Cerca de 60% do custo de produção do alumínio é referente ao gasto com energia. A conclusão é que o Brasil não está exportando alumínio e sim energia - a um preço bastante reduzido.

Nós também vimos queimadas. Algumas vezes, o céu se tornava turvo com a fumaça pálida que subia em espirais através do ar. Perto da cidade de Marabá, apesar da chuva, pudemos ver uma linha de grandes chamas avançando e engolindo as árvores. Milhões de anos de evolução dando lugar a pastagens.

Às quatro e meia da tarde, finalmente chegamos à Tucumã. Viemos direto para o Ouro Hotel, o melhor da cidade, e nos encontramos com o resto da equipe do Greenpeace e com agentes do Ibama, responsáveis pela "Operação Mogno". Fizemos uma longa reunião, revimos mapas e coordenadas, rumores e fatos até definirmos os objetivos dos próximos dias.

Também recebemos instruções de segurança. Todo mundo na cidade sabe que somos do Greenpeace e que nossa campanha está prejudicando o mercado de madeira ilegal. Por isso, não somos bem-vindos. Só podemos fazer as refeições em um lugar, que sabemos que é seguro o suficiente - há algum tempo, um agente do Ibama teve sua comida envenenada. Duas pessoas foram assassinadas nos últimos 10 dias. É, não é um bom lugar para se estar. Mas, como dissemos antes, não vamos nos calar.

O Ibama está contando com as informações do Greenpeace para prender a máfia do mogno. É assim que estamos contribuindo para que o trabalho seja feito pelas autoridades: nós fornecemos serviço de inteligência e algum apoio logístico, além de "testemunhar" as ações e documentá-las em imagens e informações acessíveis ao público. Estamos aqui, na linha de frente da batalha para salvar as florestas remanescentes do estado do Pará - antes que seja tarde demais.

Tucumã é um bom exemplo da realidade desta região do Brasil. Devo dizer que fiquei surpresa com esta vila de 10 mil habitantes, distante dos grandes centros urbanos. Primeiro, é fácil notar que é uma cidade rica. O dinheiro vem do corte de mogno e da criação de gado - e do tráfico de drogas, alguns dizem. Há boas lojas vendendo roupas de marca, vários mercados e, com poucas exceções, é possível encontrar qualquer produto que se queira. É uma cidade movimentada, com muitos carros - alguns novos e motocicletas; a maioria das estradas é asfaltada.

Todos foram para a cama cedo, já que não tínhamos certeza do que esperar para amanhã. Um silêncio profundo caiu sobre Ouro Hotel.

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