A catadora Sônia Freitas, 58, mora na orla de Manaus (AM) e explica como a cheia do Rio Negro – que atingiu 30 metros, a maior da história – impactou sua vida

As mudanças climáticas já são uma realidade e afetam principalmente as populações em situação de vulnerabilidade. É por isso que abrimos nossos canais para trazer a voz de quem já paga um preço alto pela falta de acesso a direitos básicos para uma vida digna e que têm suas vidas ainda mais impactadas pelo aumento de eventos extremos como cheias, secas e grandes tempestades. Essas pessoas são também as que menos contribuem com a crise climática.
Leia o depoimento de Sônia e acesse também nossos outros relatos.
“Me chamo Sônia, tenho 58 anos e trabalho catando latinhas no rio. Moro na orla do rio Negro, no bairro do São Raimundo. Moro com meu bebê, que é como eu chamo meu filho de 13 anos, e meu esposo.
Como moro num flutuante, não tenho casa alagada; pelo menos isso não tem sido um problema pra mim. Eu pago uma pessoa pra vir dar aula pro meu filho em casa, porque a aula que ele recebe pela Internet não é boa. E tem meses que meu marido não está com a gente: ele trabalha como piloto de barco de pesca e vive viajando pelos rios. Não sei por onde ele anda e nem quando ele volta. A vida não é fácil, tenho problemas de pressão e peguei Covid-19 duas vezes.
A cheia começou a me dar prejuízo há mais ou menos um mês. Primeiro, porque as latinhas que eu costumava juntar ficavam no leito do rio seco. Com a cheia, as latinhas foram embora. Aí acabou minha fonte de renda. Quando eu achava bastante latinha, eu tirava uns R$ 30 ou R$ 40 por dia, um valor razoável. Em dias muito bons, era R$ 100. Mas por conta da cheia estou há mais de um mês parada, sem condições de trabalhar.
Essa situação ficou pior uns dias depois, quando roubaram a minha canoa. Eu acordei de manhã cedo, de madrugada, e vi dois homens indo embora com ela. Ainda pensei em reagir, mas estava escuro e fiquei com medo de eles estarem armados. Preferi ficar quieta e não arriscar.

Depois, o rio levou minha casa pra longe da rua Beira-Mar e fiquei sem acesso à rua. Preciso de uma ponte pra chegar lá. Por onde a gente sai de casa, tá tudo alagado. E não sou só eu que sofro com isso; tem umas sete famílias que usam o mesmo caminho que eu e precisam de uma ponte pra sair de casa.
Estou com dificuldades para conseguir comida. Tem dois dias que não janto e hoje não tomei café. Recebo só o Bolsa-Família, que me paga R$ 190. Mas para quem compra comida, compra seu gás e paga aula pro filho, isso não dá pra nada. Isso não é dinheiro que dê pra manter uma casa. Aliás, nem estou mais comprando gás. Tem uns quinze dias que estou na lenha, estou sem condições de comprar gás. Ano passado recebi o auxílio emergencial que me ajudou bastante, mas esse ano não deu.
Hoje eu preciso de muita ajuda, mas preciso principalmente de alimento e madeira. A gente não tem madeira, não tem nada pra gente fazer uma rota de saída. Se eu tivesse canoa, ainda arrancava algumas ripas, juntava pra fazer ponte, mas nem isso a gente tem mais.
Eu tenho procurado algumas igrejas, fui numa igreja católica aqui perto, mas está difícil achar ajuda. Sou evangélica e na igreja que eu congrego, no Cacau-Pirêra, está tudo alagado. Eles não estão dando conta nem deles mesmos. Há muitas pessoas como eu, que estão necessitadas, e toda ajuda que vier será bem vinda. Eu confio no Deus que eu sigo, sei que ele vai tocar no coração de pessoas e que alguma ajuda vai chegar”.
O Greenpeace Brasil realiza, nos próximos dias, uma grande entrega de cestas básicas para diversas famílias atingidas pela cheia nas zonas Sul e Leste de Manaus. Mil cestas serão distribuídas, que vão totalizar 10 toneladas de alimentos e vão beneficiar cerca de 440 famílias. Sônia está incluída nesta lista de beneficiários.
Já existem soluções para a crise climática e que podem ajudar muito na resolução da crise econômica e social brasileira. Precisamos apenas ligar os pontos, contar com quem já está atuando junto e promover ações que contribuam para a construção de um mundo mais justo, inclusivo e em equilíbrio com o meio ambiente.
Assine a nossa petição para se juntar ao movimento de pessoas que reconhecem a urgência da crise climática, dar voz às pessoas mais afetadas por este problema e manter-se informado para nos mobilizarmos pela causa e pressionarmos as autoridades.

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