Para o Greenpeace Brasil, ainda que seja fundamental que o Congresso Nacional mantenha os vetos presidenciais, a Licença Ambiental Especial (LAE) e a dispensa do licenciamento para o agro são pontos críticos.

Os vetos parciais do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao PL 2159, conhecido como o PL da Devastação, foram importantes para impedir uma tragédia ainda maior na flexibilização do Licenciamento Ambiental brasileiro.
Mas, ainda que trechos graves do texto tenham sido alterados pelo governo federal, há pontos sensíveis no projeto que merecem atenção da sociedade, principalmente diante da possibilidade dos vetos serem derrubados pelo Congresso Nacional.
Ao vetar 63 dispositivos do PL, Lula criou lacunas no projeto de lei que precisam ser completadas. Para isso, foi elaborado um novo projeto de lei com as alterações propostas, que já foi encaminhado ao Congresso com urgência constitucional. Como parte das normas legislativas, esse projeto precisa ser analisado em até 45 dias. Se o prazo não for respeitado, as pautas da Câmara e do Senado são trancadas até que ele seja votado.
A Licença Ambiental Especial (LAE), um dos pontos mais polêmicos do PL, também segue como protagonista nessa nova fase. Lula apresentou uma Medida Provisória com uma nova redação para a LAE que ainda deixa dúvidas em relação à garantia de que todas as etapas de licenciamento serão realizadas.
A medida provisória tem força de lei e validade imediata, ou seja, a LAE já está funcionando na prática e produzindo efeitos legais para empreendimentos. O Congresso tem 120 dias para analisar a MP.
Para o Greenpeace Brasil e para as demais organizações que integram o Observatório do Clima, uma Licença Especial simplificada para grandes empreendimentos de alto impacto, os que comumente são tidos como estratégicos, é um contrassenso. São justamente esses projetos que precisam de maior rigor técnico e análises aprofundadas, para que a proteção do meio ambiente seja de fato assegurada.
O momento agora é de atenção, articulação e pressão junto aos parlamentares para impedir que, em nome de interesses do agronegócio, da indústria e outros setores, eles consigam concretizar o desmantelo do processo de licenciamento ambiental em nível nacional.
Analisamos as principais mudanças nos dispositivos e elencamos quais são os principais pontos positivos e de atenção em relação a cada um deles. Confira abaixo.
- LAE (Licença Ambiental Especial)
O governo apresentou uma Medida Provisória sobre a LAE, na intenção de assegurar a obediência a critérios técnicos para os empreendimentos, mas o fato de a licença haver sido introduzida no texto por Davi Alcolumbre, presidente do Senado, dificulta a melhoria do texto no Parlamento.
“A LAE abre caminho para decisões políticas que poderão atender a interesses de grandes grupos econômicos e interesses privados, antes do interesse público, como é o caso da exploração de petróleo na Foz do Amazonas”, comenta Gabriela Nepomuceno, especialista de Políticas Públicas do Greenpeace Brasil.
A porta-voz acrescenta que o texto da medida provisória apresenta imprecisões, não garantindo o licenciamento trifásico quando necessário, o que seria fundamental para a proteção do meio ambiente.
O prazo para análise dos estudos técnicos, projeto executivo e aprovação das licenças a empreendimentos de alta complexidade é de apenas 12 meses, o que as organizações ambientais consideram inviável. Além disso, o STF já considerou inconstitucional a licença simplificada para atividades causadoras de significativo impacto ambiental.
“No momento, estamos trabalhando no Congresso para que o texto da MP seja melhorado, dado que o contexto político não favorece sua rejeição”, diz Gabriela.
- LAC (Licença por Adesão e Compromisso)
O PL aprovado pelo Congresso autorizava licença por ato autodeclaratório para obras de médio potencial poluidor, o que abrangeria a maior parte dos empreendimentos. Sem estudo ambiental e sem análise prévia.
Os vetos presidenciais restringirão o alcance da LAC para empreendimentos de baixo impacto, mas ainda existe a possibilidade de o Congresso derrubar os vetos e/ou reintroduzir a LAC para médio potencial poluidor no novo projeto de lei que tramita com urgência.
- Papel dos órgãos ambientais no Licenciamento
O PL enfraquecia a competência de órgãos envolvidos no processo de licenciamento de obras e projetos com potencial impacto para comunidades indígenas, TI´s, quilombolas e Unidades de Conservação. O texto anterior retirava o caráter vinculante das decisões desses órgãos, como Funai, ICMBIO e IPHAN, sobre os processos de licenciamento.
Depois do veto presidencial, as competências atribuídas a esses órgãos foram restauradas, uma ação extremamente positiva. O Greenpeace Brasil vê esse veto como um avanço fundamental que deve ser mantido pelo Congresso.
- Direitos dos Povos Indígenas
A consulta a povos indígenas impactados por empreendimentos estava restrita no texto anterior para Terras Indígenas homologadas e terras quilombolas tituladas. Esse trecho foi vetado pelo presidente. Houve, portanto, um avanço parcial.
O novo texto proposto pelo governo busca assegurar a participação de povos indígenas e quilombolas, prevenindo conflitos e fortalecendo a participação social nas decisões que impactam diretamente modos de vida e territórios tradicionais.
Contudo, segundo o Instituto Socioambiental (ISA), a redação dada ao novo PL ignora decisões do STF que consideram a demarcação de terras um ato declaratório, uma vez que os direitos indígenas precedem o ato administrativo, sendo reconhecidos e garantidos pela Constituição Federal.
- Dispensa para o agro
Esse é um trecho em que o posicionamento do governo deixou a desejar, já que não foi vetada a dispensa de licença para atividades agrossilvipastórias. Ainda que a dispensa de licenciamento tenha ficado condicionada ao registro regular no Cadastro Ambiental Rural (CAR), o setor ainda tem ampla dispensa para atuar, com exceção da pecuária intensiva de médio e grande porte.
O veto não integral à dispensa ao agro pode ser entendido como um aceno ao Congresso para que novas negociações políticas aconteçam, o que pode gerar impactos profundos para o desmatamento.
- Mata Atlântica
Antes dos vetos, o PL permitia a supressão de vegetação primária e secundária do bioma no estágio avançado de regeneração, sem autorização de órgão federais. Conforme comunicado pela SOS Mata Atlântica, a perspectiva era de que 14% da Mata Atlântica fosse desmatada.
Após o anúncio presidencial, foram vetados totalmente os dispositivos que alteravam a Lei da Mata Atlântica – uma vitória muito importante, fruto da mobilização da sociedade civil.
- Unidades de Conservação
O texto aprovado pelo Congresso retirava o caráter vinculante de manifestação de órgãos gestores de Unidades de Conservação no licenciamento de empreendimentos que afetem diretamente a unidade. Ou seja: as UCs e suas zonas de amortecimento corriam riscos! Felizmente, o artigo foi vetado.
O veto presidencial recoloca a avaliação técnica especializada na proteção de áreas ambientalmente sensíveis em seu lugar de protagonismo, garantindo que possíveis impactos sejam devidamente analisados pelos órgãos gestores responsáveis, com influência no processo do licenciamento.
- Critérios nacionais para o licenciamento
O PL trazia como proposta que estados e municípios pudessem estabelecer critérios de licenciamento, mas isso foi vetado pelo presidente, garantindo que todos sigam uma padronização nacional.
O poder de decisão para os entes federativos poderia fazer com que o licenciamento se tornasse uma colcha de retalhos legal e uma moeda de troca nos estados, flexibilizando ainda mais o licenciamento. Com o veto, um padrão mínimo de proteção ambiental foi reestabelecido, garantindo segurança jurídica aos empreendimentos.
Gabriela Nepomuceno sublinha que, com o cenário político desfavorável no Congresso, a mobilização da sociedade civil não pode cessar.
“A manutenção dos vetos presidenciais são importantes para amenizarmos o show de horrores que esse PL anuncia. A população brasileira deve estar informada sobre a gravidade da flexibilização do licenciamento e pressionar os representantes eleitos por ela para que tenhamos um cenário menos catastrófico“, destaca a porta-voz do Greenpeace Brasil.
Sem a ajuda de pessoas como você, nosso trabalho não seria possível. O Greenpeace Brasil é uma organização independente - não aceitamos recursos de empresas, governos ou partidos políticos. Por favor, faça uma doação mensal hoje mesmo e nos ajude a ampliar nosso trabalho de pesquisa, monitoramento e denúncia de crimes ambientais. Clique abaixo e faça a diferença!