Defensores da demarcação de Terras Indígenas, os crimes contra a dupla são exemplos de como abrir esses territórios para exploração econômica é sinônimo de morte.  

Ativistas protestando após a morte dos ambientalistas Dom e Bruno.
Bruno e Dom foram assassinados no Dia do Meio Ambiente defendendo a Amazônia e as Terras Indígenas.
© Tim Aubry/Greenpeace

Há um ano, o indigenista Bruno Pereira era atravessado por três tiros que interromperam a sua breve vida de 41 anos. Breve, porém intensa e com um firme propósito: defender o modo de vida dos indígenas, em especial, dos povos isolados. E para defender essas vidas, Bruno sabia o quão importante era garantir o direito à terra e de uma natureza preservada a esses povos. 

Você sabia que no dia em que foi assassinado, Bruno seguia para a sede da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja) para comprar equipamentos que seriam utilizados em uma mega expedição pela Terra Indígena do Javari? Sim, o objetivo era refazer a demarcação física dos limites do território feita vinte anos atrás pela Funai, no momento em que a demarcação oficial da terra foi concedida.

Trata-se do projeto de uma trilha de 410 km em parte da fronteira da TI Vale do Javari que, nesses vinte anos pós-demarcação, a selva já havia engolido. Mais que um trabalho de mapeamento e monitoramento do território, o objetivo de Bruno era o de dar o recado aos invasores: essa terra tem dono; não ultrapasse os limites. 

Neste um ano de luto, os indigenistas e amigos de Bruno, Carlos Travassos e Orlando Possuelo, iniciaram o projeto de demarcação física e, junto aos indígenas da Univaja, já limparam 200 km dessa trilha. A cada centímetro avançado, temos certeza de que Bruno vive!

Também não podemos esquecer o lugar em que Bruno foi assassinado e o que ele representa para o mundo: o Vale do Javari tem a maior concentração de povos isolados do planeta! Bruno morreu tentando garantir o direito desses povos de viver como escolheram: sem manter contato com a sociedade ao redor. Pois é, os indígenas também têm o direito de livre arbítrio e Bruno respeitava isso.

Por fim, não deixemos de lembrar o jornalista Dom Phillips, que era acompanhado por Bruno em uma viagem pelo Vale do Javari e também foi assassinado naquele dia. Há quem diga que Dom morreu por “estar com Bruno naquele momento”, ignorando o que o jornalista estava fazendo ali: escrevendo um livro cujo nome seria “Como Salvar a Amazônia?”.

Por tudo isso, é muito simbólico perceber que Dom e Bruno foram assassinados na data em que se celebra o Dia do Meio Ambiente, 5 de junho. Tentaram, mas os tiros que interromperam a vida do indigenista e do jornalista não interromperam os seus trabalhos, comprovando a velha frase que diz que quando uma árvore tomba, ela espalha sementes pela floresta. Bruno e Dom foram dessas árvores frutíferas.

Marco temporal: uma afronta à memória de Bruno

Tanto o direito às suas terras de origem quanto o de viver em isolamento dos povos indígenas defendidos por Bruno estão garantidos na Constituição, mas o Congresso Nacional atacou tais direitos com a aprovação do projeto de lei 490 (que agora, no Senado, muda o nome para PL 2903), que, em uma tacada só, institui a tese do Marco Temporal (que determina uma data para que povos indígenas possam reivindicar suas terras ocupadas) e abre Terras Indígenas, inclusive de povos isolados, para a exploração econômica.

Em resumo, o projeto de lei 2903 (antigo PL 490) prevê: 

  • O Marco Temporal, tese que defende que teriam direito às suas terras somente os povos que as estivessem ocupando no dia da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988;
  • Um “contrato de cooperação” entre indígenas e não indígenas, para que estes possam realizar atividades econômicas em Terras Indígenas, desrespeitando a decisão desses povos de não ter contato com a sociedade;
  • O contato com isolados “para intermediar ação estatal de utilidade pública”, segundo o texto do projeto de lei, desrespeitando a vontade desses povos indígenas quanto ao modo de interação com a sociedade.

O Marco Temporal é um desrespeito aos que tombaram defendendo essas terras, a exemplo de Bruno, e de tantos outros, como o jornalista Dom Phillips!

Não ao Marco Temporal!

Lideranças indígenas marcharam em protesto rumo ao Supremo Tribunal Federal em 2021 para acompanhar de perto a votação do Marco Temporal. A decisão do STF deve influenciar em todas as Terras Indígenas no Brasil e definir o futuro das demarcações. O julgamento será retomado agora, 7 de junho de 2023.

Demarcar Terras Indígenas é proteger esses territórios contra invasores que espalham morte pelos rios, com a pesca ilegal e o garimpo; pelas matas, com a caça ilegal e a extração de madeira; e por toda a sociedade, com o assassinato de defensores como Bruno e Dom. Marco Temporal é a receita para o genocídio indígena e de todos a sua volta.

Por isso, é hora de nos unirmos e rejeitarmos o Marco Temporal, que será julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na quarta-feira, dia 7. Acreditamos que a Corte fará valer os direitos indígenas na Constituição, mas precisamos demonstrar que esses povos não estão sozinhos! 

Nos ajude a mostrar que os povos indígenas não estão sozinhos. Participe do abaixo-assinado Não ao Marco Temporal!

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