“Nós, jovens, trazemos conosco um novo olhar, com proposição de novos caminhos, ideias e a coragem de fazer diferente”, disse a jovem que discursou na Conferência das Nações Unidas

Da esquerda para direita: o secretário-geral da ONU, António Guterres, o jovem indiano Anurag Saha Roy, a brasileira, Paloma Costa e a ativista sueca, Greta Thunberg, na Cúpula do Clima da ONU, em 23 de setembro

A brasileira Paloma Costa, 27 anos, foi uma das jovens ativistas que marcaram presença durante a Cúpula do Clima das Nações Unidas (ONU), em Nova York, no último dia 23 de setembro. Com um discurso incisivo, Paloma cobrou os líderes mundiais a tomarem medidas efetivas de combate às mudanças climáticas.

Paloma foi convidada pela ONU para compor a mesa de abertura junto ao secretário-geral da Organização, Antonio Guterres, e à jovem ativista sueca, Greta Thunberg, que inspirou o movimento mundial da juventude chamado Fridays For Future (Sextas-feiras pelo Futuro).

Nós entramos em contato com a Paloma para saber um pouco mais sobre como foi essa experiência e entender sua visão a respeito da amplitude da voz que a juventude vem ganhando quando o assunto é clima.

Paloma é estudante de Direito na Universidade de Brasília (UnB), coordenadora do Grupo de Trabalho de Clima da ONG Engajamundo, assessora no Instituto Socioambiental (ISA), e é também responsável por coordenar a delegação de jovens para a COP25 – a Conferência do Clima da ONU que ocorrerá em dezembro, no Chile.

O que ficou claro na conversa é que discurso e ação estão bem conectados na vida da jovem que, entre tantas atividades, ainda mantém um projeto próprio, o Ciclimáticos – que consiste em viagens de bicicleta para documentar os impactos das mudanças climáticas na vida de comunidades em áreas mais vulneráveis. Paloma e seus parceiros de projeto, João Cerqueira e Igor Vieira, já pedalaram mais de 500 quilômetros.

A seguir, a entrevista:

Como foi participar da Cúpula do Clima da ONU?
No começo, quando me chamaram, eu confesso que não entendi o tanto que seria importante. Então, conforme eu fui contando para as pessoas mais próximas do Engajamundo e do ISA, fui me dando conta da relevância de ocupar esse lugar de voz. Todos me ajudaram e me apoiaram. E o que ficou claro pra mim, e que é importante que fique claro para todos também, é que eu estava ali para representar a diversidade de juventudes, principalmente indígenas e quilombolas. E o fato de eu ter sido escolhida foi justamente pela minha experiência junto a esses grupos.

Em um dado momento do seu discurso você diz que a juventude já está mudando hábitos, mas que a sociedade não está acompanhando essa mudança. Pode falar mais sobre isso?
A gente já sabe que os recentes incêndios na Amazônia foram muito piores do que os dos anos anteriores, e a gente sabe também que há empresas que incentivam esse desmatamento. E os jovens estão de olho nisso. Eu, por exemplo, por dinheiro nenhum trabalharia em uma dessas empresas. Além disso, eu decidi parar de comer carne a partir do momento em que soube que grande parte das indústrias que desmatam estão ligadas à criação de gado. Outro ponto: eu tento me locomover o máximo possível de bicicleta; inclusive, tem vezes que combino com meus amigos de sairmos à noite de bike, e vamos todos pedalando pra balada. (risos) Ou seja, tem uma juventude disposta a mudar hábitos e a construir um caminho de menor impacto. Só que o problema é que alguns de nossos líderes além de não nos seguirem, ainda questionam a crise climática. Só que está acontecendo sim e eu tenho prova disso aqui no meu celular, com registros de quem já vive seus impactos.

Aproveitando a deixa, você pode explicar um pouco sobre o seu projeto, o Ciclimáticos?
O Ciclimáticos foi um projeto que eu fundei com um amigo, o João Henrique Cerqueira, que mora em Francisco Beltrão, no Paraná. A nossa ideia era mapear iniciativas de adaptação e mitigação que algumas comunidades vulneráveis já estão fazendo diante do impactos que vivem por conta das mudanças climáticas. Além de conhecer histórias reais, nosso objetivo é entender como essas pessoas estão se adaptando e lutando em defesa de seu território. Por fim, pretendemos ainda levar todas essas narrativas para os lugares onde decisões sobre as mudanças do clima são tomadas – como as conferências de clima da ONU e espaços subnacionais de governança. E é importante destacar que como não queremos contribuir com a intensificação do fenômeno climático, decidimos fazer todos os deslocamentos de bicicleta. Com um celular e uma bicicleta, conseguimos mostrar para o mundo que as mudanças climáticas já são realidade na vida de muitos brasileiros.

Você teve contato com governantes brasileiros durante a Assembleia-Geral da ONU?
Do governo federal, não tive nenhum contato. Mas tive bastante contato com deputados e prefeitos. Quanto aos líderes internacionais, várias mulheres que ocupam cargos de poder em países africanos me chamavam e me contavam sobre essa questão da luta pela terra em suas regiões de origem. E foi bem importante ver que tinha gente que realmente estava refletindo sobre o que a gente estava falando lá.

E os governantes brasileiros, como foi esse contato?
Aqueles que vieram falar comigo, pareceram querer escutar o que eu tinha pra falar. Agora, se isso vai se transformar em algo real, em ação de verdade, aí a gente tem que esperar pra ver. Agora, é esperar todos os convites que foram prometidos.

Por fim, como você vê a amplitude que a voz da juventude vem ganhando quando o assunto é emergência climática?
O grupo de jovens que vem se unindo em torno da luta climática é formada por indivíduos com perspectivas diferentes e com modos de vida diferentes, mas que se respeitam entre si. O fato de estarmos sendo ouvidos nos dá visibilidade e esse é um passo importante que demos. E por conta disso, tem muita gente que já ocupa os lugares de voz trabalhando para que estejamos juntos neste lugar. O fato de não termos a questão climática como pauta nos espaços de educação, isso dificulta um pouco que esse assunto cresça por aqui. Mas ainda assim, o movimento mundial da juventude pela questão climática também está crescendo no Brasil. Nós, jovens, trazemos conosco um novo olhar, com proposição de novos caminhos e ideias e a coragem de fazer diferente. Isso precisa ser considerado.

Veja alguns trechos do discurso da Paloma Costa na Cúpula do Clima da ONU:

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