Meio ambiente é coisa séria

Junto com mais de 50 redes e organizações da sociedade civil, publicamos hoje um manifesto em defesa dos principais órgãos e políticas ambientais do país. No documento, reagimos a uma série de propostas que atacam o meio ambiente feitas durante a campanha eleitoral.

A fusão do Ministério de Meio Ambiente (MMA) ao de Agricultura, bem como o anúncio de enfraquecimento de órgãos de fiscalização ambiental, como o Ibama, representam um enorme e perigoso retrocesso, podendo resultar na explosão das taxas de desmatamento e colocar em risco décadas de avanços na proteção ambiental.

Outra ameaça grave é a retirada do Brasil do tratado internacional de mudanças climáticas (Acordo de Paris), o que pode prejudicar o comércio e a imagem internacionais do Brasil, tendo em vista as crescentes exigências do mercado quanto à sustentabilidade.  

Nosso manifesto também condena as propostas de enfraquecer ou mesmo acabar com o licenciamento ambiental; facilitar o uso de agrotóxicos; abrir as áreas protegidas a atividades de alto impacto ambiental; e a defesa do “fim do ativismos” no país.

Ao longo de 26 anos de atuação no Brasil, o Greenpeace nunca se furtou a criticar governos e políticos cujos projetos representassem ameaça ao meio ambiente e à população, independente do partido ou da cor da bandeira que defendem. Continuaremos defendendo o meio ambiente, a paz e a justiça social, princípios que nos norteiam desde nossa fundação, e de forma independente.

Leia o manifesto na íntegra:

Desvalorizar o meio ambiente é um risco para todo brasileiro

Patrimônio e direito de toda a sociedade, cabe a ela não abrir mão de seu capital natural

Estamos a poucos dias do segundo turno das eleições. O momento é desafiador para os brasileiros e para o Brasil. Chegou a hora de se unir a favor da proteção do meio ambiente, direito e patrimônio de toda a sociedade brasileira.

O Brasil detém a maior biodiversidade do mundo e belas paisagens naturais que atraem anualmente milhares de turistas. O futuro e o desenvolvimento do País também dependem da boa gestão do seu capital natural. Aqui está a maior área de floresta tropical contínua do planeta, que ajuda a regular o clima, produzir água, estocar carbono nas árvores, manter solos férteis para a agricultura, reduzir o risco de desastres naturais, dentre tantos outros serviços. O país não pode abrir mão da proteção conferida ao meio ambiente pela Carta Cidadã de 1988.

A economia brasileira, hoje em grande medida conectada aos mercados globais, depende do equilíbrio entre produção e proteção ambiental para prosperar. Retrocessos na agenda ambiental do País podem representar riscos enormes à reputação das empresas e produtores brasileiros, colocando o Brasil na contramão do movimento global de transição para a economia de baixo carbono.

O Ministério do Meio Ambiente (MMA) e seus órgãos têm papel central na implementação das políticas ambientais, que não se resumem àquelas afetas ao setor agropecuário, englobando, entre outros, a preservação dos biomas brasileiros, a proteção da biodiversidade e o combate à biopirataria, o combate ao desmatamento ilegal e outros crimes ambientais. Além disso, define e efetiva áreas protegidas, controla os variados tipos de poluição e de resíduos sólidos, gerencia os recursos hídricos, analisa a sustentabilidade de empreendimentos de impacto ambiental e combate às mudanças climáticas.

Eventual extinção do MMA, com a sua incorporação ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), e o esvaziamento das funções de seus órgãos, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), resultaria em violação sem precedentes a todo o Sistema Nacional do Meio Ambiente, desenvolvido a partir da Política Nacional do Meio Ambiente, de 1981.

A subordinação de tais funções à pasta da agricultura, além de demonstrar franco desconhecimento do tema, geraria conflitos de interesses insuperáveis e colocaria em risco quatro décadas de avanços na proteção do meio ambiente. A eliminação do licenciamento ambiental, um dos principais instrumentos da política ambiental, e a ampliação do uso de agrotóxicos no País, retirando da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e do IBAMA a competência de avaliar os impactos à saúde da população e ao meio ambiente, expõem toda a sociedade nacional a danos irreversíveis.

O anúncio de uma possível saída do Brasil do Acordo de Paris é inconsequente e demonstra desprezo a um dos mais importantes tratados internacionais de proteção ao meio ambiente, às presentes e futuras gerações, podendo gerar enormes prejuízos diplomáticos e comerciais ao País. Mais de 95% dos cidadãos brasileiros consideram que as mudanças climáticas já afetam o Brasil. Líderes de todo o planeta, a exemplo do Secretário-Geral da ONU, Antonio Guterres, alertam que o mundo corre riscos de danos irremediáveis diante das mudanças climáticas, com consequências desastrosas para toda a população mundial e os sistemas naturais que a sustenta.

Na mesma direção, a proposta de abrir Terras Indígenas, Territórios Quilombolas e Unidades de Conservação à mineração, à agropecuária e demais atividades de impacto desconsidera a sua essencialidade para a sobrevivência física e cultural de povos e comunidades tradicionais e também para o equilíbrio ambiental, visto se tratar das áreas mais preservadas de todo o País.

Defender o fim do ativismo – inclusive do ambiental – representa afronta à Constituição Federal e à democracia, que asseguram livre direito de expressão, de organização, manifestação e mobilização social na defesa de direitos. Isso se torna ainda mais grave em função da posição ocupada pelo Brasil de recordista mundial em assassinatos de defensores do meio ambiente.

Tais medidas, ao arrepio da Constituição, podem fazer explodir o desmatamento na Amazônia, no Cerrado, na Mata Atlântica e nos demais biomas brasileiros, que já é alto. Se isso acontecer, o País todo vai sofrer, não só porque perderemos irreversivelmente nossas fauna e flora, mas também porque é da floresta conservada que depende o regime de chuvas de todo o continente sulamericano, que viabiliza, por exemplo, a irrigação de plantações agrícolas no Brasil ou que mantém cheios os reservatórios do Sudeste, Nordeste e Centro-Oeste. A ciência brasileira nos alerta: se o desmatamento da Amazônia atingir entre 20% e 25% (o desmatamento acumumulado atualmente é de 19%), a floresta entrará em um “ponto de não retorno”, a partir do qual todo o seu equilíbrio será modificado, passando por processo irreversível de savanização, com a perda de seus serviços ambientais. Ademais, é no Cerrado, cujo desmatamento já ultrapassou 50%, que estão as nascentes dos mais importantes rios brasileiros, como o Paraná, o Tocantins e o São Francisco. Para além de todos os riscos ambientais, a adoção das propostas em tela terá impactos negativos nas relações comerciais do Brasil com os demais países do mundo.

Diante da gravidade deste cenário à área socioambiental, as organizações signatárias vêm alertar à sociedade brasileira e à comunidade global sobre os riscos concretos e irreversíveis a que estão expostas.

Meio ambiente é coisa séria. Diz respeito à nossa qualidade de vida e ao mundo que deixaremos para nossos filhos, seja qual for a nossa forma de pensar, agir e lutar. A sua proteção constitui direito fundamental de toda a sociedade brasileira, configurando-se como pauta apartidária. O próximo Presidente da República tem o dever de reconhecer e se comprometer com a proteção das conquistas ambientais da sociedade. É preciso caminhar em direção à Constituição Cidadã; não se afastar dela.

Assinam:

350.ORG Brasil

Amigos da Terra

APREC- Ecossistema Costeiros

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib)

Associação dos Servidores do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Asibama-DF)

Associação Mar Brasil

Associação Nacional da Carreira de Especialistas em Meio Ambiente (Ascema-Nacional)

Associação Potiguar Amigos da Natureza

Centro de Trabalho Indigenista (CTI)

Comissão Ilha – CIA

Conectas Direitos Humanos

Coordenação das Organizações Indígena da Amazônia Brasileira (Coiab)

Crescente Fértil

Eco-Canto

Ecologia e Ação (ECOA)

Engajamundo

Federação das Reservas Ecológicas Particulares do Estado de São Paulo (FREPESP)

Frente por uma Nova Política Energética

Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (FBOMS)

Fórum de Mudanças Climáticas e Justiça Social

Fórum Mato-grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (FORMAD)

Greenpeace

Grupo de Ação Ecológica (GAE)

Grupo Ambientalista da Bahia (Gamba)

GT Infraestrutura

Instituto AUÁ

Iniciativa Verde

Instituto Centro de Vida (ICV)

Instituto de Estudos Avançados

Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc)

Instituto de Pesquisa e Formação Indígena (Iepé)

Instituto Ethos

Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB)

Instituto Os Guardiões da Natureza (ING)

Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN)

Instituto Socioambiental (ISA)

International Rivers Network (IRN)

Mater Natura – Instituto de Estudos Ambientais

Mira-Serra

Observatório de Justiça e Conservação

Observatório do Clima

Operação Amazônia Nativa (OPAN)

Rede Cerrado

Rede de Cooperação Amazônica (RCA)

Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA)

Rede Pantanal

Sabe Brasil

Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS)

SOS Mata Atlântica

Terra de Direitos

WWF-Brasil

 

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