Greenpeace Brasil alerta que, caso a moratória seja extinta, a soja voltará a consumir a floresta amazônica rapidamente
Em um cenário global, encerrar a Moratória da Soja também enterrará qualquer chance de o Brasil cumprir suas metas climáticas dentro do Acordo de Paris

A poucos meses da COP30 – evento que colocará a Amazônia no centro das atenções globais – a superintendência-geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) deu um passo atrás na proteção de florestas e suspendeu a Moratória da Soja, um acordo multissetorial em vigor há quase duas décadas que proíbe a compra de soja cultivada em áreas desmatadas no bioma Amazônia após 2008. A suspensão foi anunciada na segunda-feira (18).
“Avançar com o desmonte de um acordo eficaz, reconhecido internacionalmente e construído ao longo de quase vinte anos, em nome do desmatamento livre, seria um tiro no pé. Sem a Moratória da Soja, considerada um dos acordos multisetoriais mais eficazes do mundo, abre-se caminho para a soja voltar a ser um grande vetor de desmatamento na Amazônia, e isso enterrará qualquer chance de o Brasil cumprir suas metas climáticas. Diante disso, é inacreditável que a Moratória tenha sido suspensa há apenas três meses da COP30”, alerta a coordenadora de florestas do Greenpeace Brasil, Cristiane Mazzetti.
A Moratória nunca foi um obstáculo ao crescimento da soja: enquanto os municípios monitorados pelo acordo registraram uma redução de 69% no desmatamento entre 2009 e 2022, a área plantada com soja no bioma Amazônia cresceu 344%. Nesse mesmo período, o Brasil se consolidou como o maior exportador de soja do mundo e passou a responder por mais de um terço da produção global. A Moratória da Soja se mostrou, portanto, uma ferramenta capaz de conciliar produção agrícola e conservação florestal, além de garantir o acesso a mercados internacionais cada vez mais exigentes, fortalecendo a imagem do Brasil como país ambientalmente responsável.
“Ao suspender este acordo, o CADE não apenas estimula o desmatamento, mas também força os mercados a aceitarem soja de desmatamento e silencia o direito do consumidor de escolher produtos que não contribuam para a devastação da Amazônia. Além disso, cria-se um precedente muito ruim, desestimulando outras iniciativas que vão além da lei e visam reduzir o impacto de cadeias agropecuárias no desmatamento e no clima”, explica a porta-voz.
Em um cenário global, o possível fim da Moratória da Soja também vai na contramão de demandas do mercado exportador da soja brasileira, a exemplo da Lei Anti-Desmatamento da União Europeia, prevista para entrar em vigor no final de 2025. A decisão também contribui negativamente para a investigação comercial que o governo de Donald Trump está conduzindo sobre o desmatamento ilegal no Brasil, alegando que o país não estaria conseguindo aplicar efetivamente as leis destinadas a impedir o desmatamento ilegal, prejudicando a competitividade dos produtos agrícolas norte-americanos.
Como o ocorrido trata-se de uma suspensão, o Greenpeace Brasil espera que a decisão preventiva da superintendência do CADE seja revista e que o processo seja finalizado, e que acordos multissetoriais como a Moratória sejam retomados e/ou criados, para que tenhamos cada vez mais ambição em relação aos necessários compromissos socioambientais de todos os setores.
Histórico de ataques
Apesar de sua eficácia, a Moratória da Soja é alvo de fortes ataques por parte de setores do agronegócio e de políticos alinhados aos seus interesses, que tem atuado para enfraquecer regulações e leis ambientais – a exemplo do que temos assistido com o PL da Devastação. Estados como Mato Grosso, Rondônia e Maranhão aprovaram leis recentemente que restringem incentivos fiscais e outros benefícios a empresas que aderiram a compromissos voluntários mais ambiciosos de proteção do meio ambiente do que o mínimo exigido por lei. O cenário se agravou com a abertura da investigação pelo CADE, que apura se o acordo configura prática anticompetitiva – o que levou à suspensão preventiva anunciada na segunda-feira.
“A suspensão da Moratória da Soja é resultado da pressão de alas retrógradas do agronegócio que ameaça quase duas décadas de avanços, pune quem protege as florestas e favorece quem mais lucra com a destruição da Amazônia”, afirma Mazzetti.
Contexto
A Moratória da Soja é um acordo multissetorial pelo qual comerciantes de commodities concordaram em não comprar soja de fazendas no Bioma Amazônia que foram desmatadas após julho de 2008. Anunciado em 2006 por grandes empresas exportadoras de soja brasileira filiadas à Abiove e Anec após uma forte campanha do Greenpeace, apoiada por entidades da sociedade civil brasileira, que chamou a atenção para o papel da expansão da soja no desmatamento da Amazônia.
Em 2008, o então ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, anunciou a adesão do governo brasileiro à Moratória. O acordo entre a indústria, ONGs e governo destinado a eliminar o desmatamento das cadeias de fornecimento de soja passou a ser renovado periodicamente. Em 2016, a Moratória foi renovada por tempo indeterminado.
Sem a ajuda de pessoas como você, nosso trabalho não seria possível. O Greenpeace Brasil é uma organização independente - não aceitamos recursos de empresas, governos ou partidos políticos. Por favor, faça uma doação mensal hoje mesmo e nos ajude a ampliar nosso trabalho de pesquisa, monitoramento e denúncia de crimes ambientais. Clique abaixo e faça a diferença!