Parque Estadual Serra de Ricardo Franco pode perder o status de área protegida. Região de enorme importância biológica está ameaçada pelo avanço da pecuária
Uma área de 158 mil hectares de fauna e flora ainda pouco estudada pela ciência, equivalente em extensão ao município de São Paulo, corre o risco de ser totalmente destruída por conta de uma votação que está prestes a acontecer na Assembleia Legislativa de Mato Grosso. Trata-se do Parque Estadual Serra de Ricardo Franco, instituído em 1997. Localizado em uma região em que o Cerrado, o Pantanal e a Amazônia se encontram, o parque abriga uma biodiversidade única e ainda pouco conhecida.
A bandeira verde para a destruição do parque pode vir pelas mãos da deputada estadual e presidente interina da Assembleia Legislativa, Janaína Riva (MDB), que decidiu pautar para hoje (11/05) a votação de um decreto legislativo que extingue o parque do status de interesse público da área da Serra Ricardo Franco, em Vila Bela da Santíssima Trindade (a 520 km de Cuiabá).
Após ser aprovado em primeira votação, o projeto que destitui a região de área protegida estava parado há cinco anos na Assembleia, após um pedido do Ministério Público Estadual para que o tema fosse melhor discutido. A mudança de status do parque neste momento interessa a lideranças políticas na região, especialmente em ano de eleição.
Uma investigação do Greenpeace Brasil em 2020 mostrou que, na época, mais de 38 mil hectares da área que deveria estar sob condição de proteção integral foram desmatados, dos quais 33% ocorreram após a criação da unidade. Das 137 fazendas existentes no parque (segundo análise dos registros do Cadastro Ambiental Rural), duas chamaram a atenção: Paredão I e II, com 4.123 hectares, dos quais 2.096 hectares foram desmatados ilegalmente.
O ex-ministro Eliseu Padilha aparecia como sócio-proprietário em uma das fazendas, junto com seu ex-assessor e sócio, Marcos Antonio Assi Tozzatti. Padilha, no caso, está associado à empresa Jasmim Agropecuária e Reflorestamento LTDA. Tozzatti aparece como o proprietário da outra fazenda Paredão.
A investigação mostrou que, entre abril de 2018 e junho de 2019, a fazenda Paredão comercializou gado com outras fazendas que destinaram gado para frigoríficos da Marfrig, Minerva e JBS (via Fazenda Barra Mansa), que por sua vez exportaram produtos de carne para diversos países. E o problema não parou aí. Um levantamento atual do Greenpeace mostra que, pelo menos da fazenda Barra Mansa, a JBS continua comprando gado. Somente em 2022, já foram cinco compras de bois, segundo a base de dados da JBS.
De acordo com o Observatório Socioambiental de Mato Grosso, “além de promover a impunidade, a medida incentivará o desmatamento, afetando os compromissos internacionais de Mato Grosso para o enfrentamento e mitigação das mudanças climáticas”. A entidade também informa que “mais de 72% da área do parque é ocupada por vegetação natural, mas cerca de 24% teve desmatamentos registrados até 2017”. A organização também afirma que a transformação da área em parque freou o desmatamento.
O Instituto Centro de Vida (ICV) também tem feito alertas quanto à votação do projeto, que alega ser inconstitucional e que pode gerar desmatamento em um dos destinos turísticos mais exuberantes do estado.
A porta-voz da campanha da Amazônia do Greenpeace Brasil, Cristiane Mazzetti, explica o risco que a medida pode significar para a região: “Em um grave momento de disparada do desmatamento e de invasões em terras públicas, é um absurdo aprovar a toque de caixa um projeto tão polêmico como este, que extingue uma importante unidade de conservação. Enfrentamos uma crise global do clima e de perda de biodiversidade e, em vez de criar mais áreas protegidas, que contribuem com o enfrentamento desses problemas, os deputados de Mato Grosso defendem o interesse de poucos fazendeiros nesta tentativa de extinguir as que já existem”, afirma.
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