No encontro, uma rede se forma para compartilhar lutas, construir alianças e traçar estratégias de enfrentamento à crise climática e às desigualdades

Acampamento Global de Justiça Climática, na Tanzânia, outubro de 2024. Foto: Magsman Media

Este texto é sobre uma jornada que nos levou não apenas a cruzar o Oceano Atlântico, mas a atravessar o continente africano até bem perto do Oceano Índico. O destino final? O Acampamento Global de Justiça Climática, na Tanzânia, no coração da África Subsaariana, onde 300 jovens ativistas do Sul Global se reuniram para compartilhar histórias, construir alianças e trocar experiências. Apesar das distâncias geográficas, as lutas que nos unem mostram o quanto temos em comum na busca por um futuro mais justo, resiliente e sustentável.

Entre os dias 8 e 12 de outubro de 2024, a delegação do Greenpeace Brasil participou desse encontro na cidade de Arusha. A viagem de alguns membros da delegação incluiu até quatro voos e mais de 24 horas de deslocamento, em meio a muitas expectativas e ansiedades.

Delegação brasileira do Greenpeace Brasil no Aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, momentos antes de embarcar para o Acampamento Global de Justiça Climática, na Tanzânia. Outubro de 2024.

Nosso primeiro encontro aconteceu ainda no Brasil, no aeroporto de Guarulhos, onde representantes de todas as regiões do país se reuniram para embarcar. Voamos primeiro para Doha, no Catar, depois para Zanzibar, uma ilha da Tanzânia, e finalmente, Arusha, o destino final.

O Acampamento foi criado para reunir jovens que estão na linha de frente da crise climática, permitindo que juntos articulem ações e pressionem líderes globais e corporações para reduzir emissões, promover medidas de adaptação e exigir reparações pelos danos sofridos pelas comunidades menos responsáveis pela crise, mas as mais afetadas.

A imagem mais forte que me vem à mente sobre todos esses dias é a de uma grande teia, forte, complexa, com tramas por vezes simétricas ou assimétricas, mas precisas, desenhadas para acolher toda a diversidade que se entrelaça em sua estrutura. Sua força não está apenas na aparência, mas na capacidade de segurar o que, a princípio, parece impossível: as dores, os desafios e os sonhos compartilhados que se unem para (re)tecer o presente e desenhar um futuro que resiste e responde ao impacto mais avassalador das mudanças climáticas, garantindo direitos a quem é ou foi mais impactado, com recursos suficientes para sua resiliência e manutenção do bem viver.

Feira de troca de experiências durante o Acampamento Global de Justiça Climática, na Tanzânia, em outubro de 2024. Foto: Magsman Media

O dia a dia de um acampamento climático

Os dias começavam com um café da manhã repleto de oportunidades. Era o momento de conhecer novas pessoas, mergulhar em suas histórias, discutir projetos e desafios, e compartilhar contatos que muitas vezes resultaram em novas amizades.

Depois do café, os jovens de mais de 100 países se reuniam em salas para debater temas de interesse, como COP (Conferência do Clima da ONU), gênero e clima, “justiça climática, conflito e desmilitarização”, transição energética, adaptação e resiliência, e poluição por plástico. O dia era preenchido com oficinas, palestras e trocas de experiências que fomentavam um ambiente de aprendizado constante.

Delegação brasileira do Greenpeace Brasil no Acampamento Global de Justiça Climática, na Tanzânia, em outubro de 2024. Da esquerda pra direita, na frente, Camila Doretto, do Greenpeace Brasil, Bruno Thomazi Zanette, do coletivo Eco Pelo Clima (RS), Mateus Fernandes, comunicador e ativista climático de Guarulhos (SP), Janderson Souza, do Time de Ativistas do Greenpeace Manaus e Tamires de Oliveira, do Grupo de Voluntários do Greenpeace Brasil em João Pessoa (PB). Na fileira de trás, da esquerda pra direita, Rafael Ferraz e Rodrigo Jesus, do Greenpeace Brasil, Ana Rosa Cyrus, de Belém e representante do Engajamundo, Natália Mapuá, de Belém e representante da Cooperação da Juventude Amazônida para o Desenvolvimento Sustentável (COJOVEM) e Sally Freitas, jovem indígena ativista do povo Guarani Nhandeva, do Mato Grosso do Sul,.

Delegação Brasileira do Greenpeace Brasil

A delegação brasileira do Greenpeace Brasil, composta por representantes da campanha de Justiça Climática e do time de Mobilização de Comunidades da organização, voluntários e jovens ativistas de diferentes regiões do país, levou a diversidade do nosso país para compartilhar prioridades sob a ótica da Justiça Climática. Eles e elas colocaram o Brasil no centro das discussões globais sobre adaptação climática e uma transição energética justa.

Em um painel sobre a COP 30, a Conferência do Clima da ONU, os jovens brasileiros discutiram os impactos do evento tanto para a cidade sede do evento, Belém, no Pará, quanto para os ativistas climáticos de favelas e territórios indígenas de outras regiões que se preparam para o encontro mundial.

Participaram do debate Natália Mapuá, da Cooperação da Juventude Amazônida para o Desenvolvimento Sustentável (COJOVEM), Ana Rosa Cyrus, do Engajamundo, ambas de Belém, Mateus Fernandes, comunicador e ativista climático morador de Taboão, um bairro periférico de Guarulhos, na região metropolitana de São Paulo, Sally Freitas, jovem indígena ativista do povo Guarani Nhandeva, do Mato Grosso do Sul, comunicadora da Apib e da Assembleia Geral do povo Kaiowá e Guarani, Bruno Thomazi Zanette, do coletivo Eco Pelo Clima, do Rio Grande do Sul, e Mikaelle Farias, de João Pessoa (PB), representante do Fridays For Futures e da Palmares Lab.

A juventude trouxe um olhar crítico sobre a presença massiva e crescente de lobistas petroleiros nas conferências do clima e alertou para o fato dos recentes flertes do governo brasileiro com a exploração de petróleo na Foz do Amazonas. Além disso, Natália Mapuá enfatizou a importância de ocupar esses espaços com lideranças que realmente estão na linha de frente da crise climática, como as comunidades locais, especialmente indígenas e amazônidas.

Ana Rosa Cyrus alertou para o fato de que o Sul Global precisa aproveitar essa oportunidade da COP no Brasil questionando e pressionando diretamente as estruturas de poder. “A ONU não vai se moldar pra gente. Nossa grande oportunidade agora é tentar hackear esse processo por dentro. Por que não podemos aproveitar essa chance para que os nossos sejam líderes desse processo?”, pontua.

“A oportunidade está em abrir esses espaços para uma representação genuína, garantindo que o protagonismo esteja com aqueles que mais sofrem as consequências da crise e não com os que lucram com ela”, complementa.

Tamires de Oliveira, do Grupo de Voluntários do Greenpeace Brasil em João Pessoa, e Mateus Fernandes, ativista e comunicador de São Paulo, conduziram oficinas sobre “Ativismo Socioambiental e Segurança Alimentar: Estratégias para a Sustentabilidade e Resiliência Comunitária” e “Estratégias de Mobilização e Incidência em Políticas Públicas Latino-Americanas”, respectivamente.

Tamires apresentou a iniciativa de uma horta comunitária em seu território, a Horta Comunitária do Timbó, que tem como objetivo não só o cultivo de alimentos como forma de fortalecer a resiliência local, mas também de promover o empoderamento da juventude e o fortalecimento da comunidade.

“As conexões que tenho feito têm me chamado muita atenção porque me tiram do meu lugar e me colocam em outro, onde consigo compreender outras realidades e até enxergar um pouco da minha dentro de contextos que pareciam tão diferentes até então. Isso tem sido, para mim, fantástico e desafiador também”, comenta Tamires.

Mateus, por sua vez, conduziu sua oficina incentivando participantes de diversos países a identificar os principais problemas e vulnerabilidades causados pela crise climática na América Latina. Juntos, os participantes exploraram soluções colaborativas, culminando em um forte sentimento de identidade compartilhada ao perceberem a semelhança entre desafios e soluções.

“Compartilhar minha história de vida, ocupar esse espaço, me trouxe inúmeros conhecimentos sobre outras lutas, mas, principalmente, sobre o que podemos fazer enquanto povos da América Latina. É importante ressaltar que o enfrentamento da crise climática é um desafio coletivo que exige união e aprendizado com outras comunidades, principalmente as mais afetadas no Sul Global”, compartilha Mateus, que foi responsável pela cobertura do Acampamento para as Redes Sociais do Greenpeace Brasil.

Acampamento Global de Justiça Climática, na Tanzânia, outubro de 2024. Foto: Magsman Media

Justiça climática já!

O Sul Global é uma das regiões mais vulneráveis às mudanças climáticas e sofre com os impactos diariamente. Existe uma injustiça histórica: os países e comunidades que menos contribuíram para o problema são os que mais sofrem. As nações do Norte Global não reduziram suas emissões como deveriam e nem enviaram recursos para que os países mais afetados se adaptassem às mudanças climáticas. Eventos internacionais como a COP29 e COP30 são essenciais para avançar nessas questões. Pessoas, governos e empresas precisam agir, pois todos temos um papel nessa mudança.

A mudança sistémica e uma transformação real e significativa só é possível se nos unirmos, cobrarmos e pressionarmos expondo os maiores responsáveis pela crise mundial do clima que vem provocando mortes. Só com união conseguiremos promover uma transformação significativa.

Sem a ajuda de pessoas como você, nosso trabalho não seria possível. O Greenpeace Brasil é uma organização independente - não aceitamos recursos de empresas, governos ou partidos políticos. Por favor, faça uma doação hoje mesmo e nos ajude a ampliar nosso trabalho de pesquisa, monitoramento e denúncia de crimes ambientais. Clique abaixo e faça a diferença!