Acordo firmado pelos governos para estabelecer um Fundo de Financiamento de Perdas e Danos é um passo fundamental para reparação histórica a países ameaçados pela crise climática
Talvez você já esteja vestindo a camisa da seleção e tirando aquela cervejinha da geladeira para celebrar o início da Copa do Mundo no Qatar e torcer pelo Brasil. Antes, queria te contar sobre a COP – isso mesmo, sem o “A”, um evento que também define vitórias e derrotas para os países – nesse caso, porém, o que está em jogo é nossa própria sobrevivência.
Entenda o que é a COP:
A 27ª edição da Conferência do Clima da ONU, a COP27, em Sharm El-Sheikh, no Egito, terminou hoje bastante atrasada, nos 45 do segundo tempo, mas com uma vitória: a criação de um fundo para perdas e danos aos países que mais sofrem com os efeitos da crise climática. Essa é uma forma de países desenvolvidos compensarem e repararem os países em desenvolvimento pelas consequências desastrosas das mudanças no clima, em que já não cabe adaptação.
Podemos considerar a criação desse fundo um marco, porque os países desenvolvidos finalmente reconhecem a dívida histórica que têm com países e comunidades que já estão pagando com seus corpos e territórios os impactos do aquecimento global. A África, por exemplo, que recebeu a COP este ano, é um dos continentes mais prejudicados pela elevação do nível das águas e eventos extremos como secas, mas que menos contribuiu com o lançamento de gases do efeito estufa na atmosfera ao longo dos séculos.
Essa é uma questão de justiça climática, e acabamos de dar o primeiro passo para alcançá-la. Agora, é preciso garantir que esse dinheiro chegue de fato para quem mais precisa dele. São pessoas que estão no chão da floresta e em regiões periféricas dos centros urbanos, por exemplo.
Promessas ainda não cumpridas
Ainda que seja um dia histórico para a política climática, outras questões importantes seguem emperradas. Uma delas está relacionada a ações para mitigação e adaptação às mudanças climáticas, como a promessa feita pelos países desenvolvidos de injetar US$ 100 bilhões por ano para apoiar os países mais pobres a implementar políticas de redução de carbono e aumentar sua resiliência aos impactos climáticos.
Outro tema que segue sendo jogado para escanteio é como alavancar o fim dos combustíveis fósseis. Infelizmente, o lobby de alguns governos e empresas de combustíveis fósseis na COP27 foi forte o suficiente para impedir avanços nas discussões sobre a eliminação de carvão, petróleo e gás, crucial para que o Acordo de Paris seja cumprido e o aquecimento do planeta se limite a 1,5ºC até o fim do século. Ainda que um grande número de países do Norte e Sul global tenham apoiado essa demanda por aqui, a presidência egípcia resolveu… fazer a egípcia, ignorando-a.
Acontece que quanto mais toneladas de CO2, metano e outros gases lançados na atmosfera, mais dinheiro será necessário para ações de adaptação e reconstrução. A transição energética é essencial para frearmos a crise do clima. Os países precisam levar isso em consideração urgentemente, se quisermos alcançar a tão esperada justiça climática.
Não deve ser por acaso que a “COP da África” se encerre no Dia da Consciência Negra no Brasil, data em que celebramos as culturas de matriz africana e reforçamos a luta contra o racismo. As populações negras e periféricas estão entre as mais afetadas pela crise climática, resultado de processos históricos e estruturais de injusta segregação. Junto com povos originários e comunidades tradicionais, mulheres, crianças e idosos, essas populações devem ter prioridade nas ações de adaptação, compensação e reparação pelos efeitos das mudanças do clima.
Foram duas semanas intensas aqui no Egito. Hoje, ao caminhar pelos pavilhões vazios e estruturas desmontadas de uma conferência que termina, só conseguia pensar na reflexão trazida por Thuane Nascimento, do Perifa Connection, no encontro da sociedade civil com o presidente eleito Lula na COP27:
“Nosso tempo não é o tempo do Norte global, é o tempo da emergência climática. Perdas e danos acontecem todos os dias para nós, que não temos saneamento básico, moramos em casas precárias. A gente já vive no racismo ambiental. A falta de água acontece há 40 anos para nós”. Como Thuane pontuou, “tudo é para ontem” para quem vive em regiões periféricas.
A “COP do mundo” nos traz o alerta de que precisamos correr, não atrás da bola, mas em defesa da grande bola azul chamada Terra.
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