Presente nos puns e arrotos das vacas, e emitido a partir do esterco de animais de criação, o gás metano é um dos supervilões da crise climática, e a má notícia: o Brasil produz um montão dele
Vocês já devem ter ouvido falar de aquecimento global, certo? Trata-se do aquecimento da superfície da Terra e dos oceanos, provocado pela concentração de gases que esquentam nossa atmosfera. O dióxido de carbono (CO2) é o mais conhecido deles, emitido pela queima de combustíveis fósseis e pela mudança do uso da terra, o conhecido desmatamento. Mas existe um outro gás, bem menos famoso, que é 80 vezes mais potente para o aquecimento global que CO2 num intervalo de 20 anos: o metano. Sua emissão precisa ser reduzida.
Embora o dióxido de carbono seja um gás com efeito de estufa bem conhecido e que permanece na atmosfera durante séculos – a vida útil do metano é mais curta, ele desaparece da atmosfera em apenas 12 anos se não continuarmos a emiti-lo – o gás metano é mais potente e aquece o nosso planeta mais rapidamente do que outros gases, causando muitos danos ao nosso clima.
A concentração atual de metano é quase 3 vezes maior do que era durante a era pré-industrial, e as emissões deste gás estão subindo mais rápido do que nunca. O metano ocorre naturalmente na Terra, mas também é liberado pela ação humana, sendo resultante da operação de setores como óleo, gás e carvão, agricultura (cultivo de arroz), criação de animais (indústria de carne e laticínios) e resíduos. Mas uma forma relevante em que ele é produzido e liberado na atmosfera é durante a digestão das vacas.
Arrotar faz parte do processo digestivo das vacas e, à medida que esses animais comem plantas e as decompõem no estômago, o metano é produzido e liberado quando elas arrotam. E uma vaca pode arrotar a cada 90 segundos, o que é muito! O metano na criação de animais também é produzido a partir de grandes quantidades de esterco de porco, vaca e galinha. Quanto mais desses animais em um só lugar, mais estrume e mais metano. Considerando a escala global de produção industrial de carne e laticínios, as emissões do setor são substanciais e representam um enorme problema para o clima e para todos nós.
Um novo relatório publicado pelo Greenpeace Nórdico estimou que as emissões de metano de 29 empresas do setor da carne e lacticínios rivalizam com as das 100 maiores empresas mundiais do setor dos combustíveis fósseis para a emissão do gás. E aponta que mudanças sistemáticas na produção e no consumo em países de renda média e alta poderiam proporcionar um efeito de arrefecimento significativo até 2050, com alguns resultados positivos já em 2030.
Em contrapartida, se não for regulamentado, a projeção é que o setor de produção de carne e lacticínios, sozinho, aqueça o mundo em mais 0,32°C até 2050. As novas projeções baseiam-se no cenário da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) para uma trajetória de manutenção do ritmo atual de produção até 2050.
Atualmente, os cinco maiores emissores de metano do setor da carne e lacticínios são JBS, Marfrig, Minerva, Cargill e Dairy Farmers da América, segundo o relatório. As emissões dessas empresas superam as emissões combinadas de metano dos grandes gigantes dos combustíveis fósseis como a ExxonMobil, Shell, Total Energies, Chevron e BP.
Segurar o avanço da pecuária é bom para a Amazônia, para os animais e para o planeta
A produção global de carne e lacticínios é impulsionada por uma série de grandes empresas e segue crescendo como se não existisse amanhã. No Brasil, pastagens ocupam cerca de 90% da área desmatada na Amazônia até 2023, segundo o Mapbiomas, e o relatório do Greenpeace Nórdico mostrou como as emissões de metano da pecuária rivalizam com as da indústria de combustíveis fósseis (para metano).
Segundo o relatório, a JBS, o maior produtor de carne do mundo, e conhecida por seu péssimo histórico de envolvimento com o desmatamento, é responsável por mais emissões de metano do que a ExxonMobil e Shell juntas. De fato, a empresa ocuparia o 5º lugar em comparação com as maiores empresas emissoras de metano no setor de fósseis.
Mudanças na forma e intensidade da produção de carne e laticínios é um passo crucial para mitigar as emissões de metano e desacelerar o aquecimento global – e a maneira mais eficaz de fazer isso é fazer a transição para um sistema de produção de alimentos que seja muito mais justo para nós, os animais e o planeta.
Portanto, precisamos cortar o metano tanto das grandes empresas de criação de animais, como das grandes empresas petrolíferas. Embora a diminuição das emissões de metano possa reduzir o ritmo do aquecimento global, segue sendo essencial eliminar gradualmente a emissão de CO2 , produzido em grande parte devido ao uso de combustíveis fósseis. Só assim poderemos para lidar com o caos climático e estabilizar o clima.
O agronegócio, que inclui a indústria de carnes e laticínios, vem deixando um rasto de destruição em todo o planeta, contribuindo fortemente para a crise climática, sendo as emissões de metano uma parte significativa do problema. Na questão do clima, o setor agropecuário precisa ser visto também como parte do problema, e ser chamado a reduzir drasticamente suas emissões.
Neste sentido, governos ao redor do mundo (incluindo o Brasil) devem: a) atuar a partir de leis e metas oficiais para reduzir as emissões da agropecuária, incluindo o gás metano; b)obrigar as empresas a reportar publicamente sobre suas emissões; c) introduzir políticas para reduzir o consumo exagerado de proteína animal incentivando dietas mais sustentáveis, d) fomentar uma transição ecológica justa, e dentre as ações, deve estar o redirecionamento de fundos.
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