Testes realizados no Brasil e na Alemanha revelam que a produção agrícola brasileira vem deixando um vasto rastro de agrotóxicos que prejudicam nossa saúde e o meio ambiente
O Greenpeace Brasil já havia denunciado que brasileiros estão expostos a alimentos contaminados com resíduos de agrotóxicos nocivos à saúde. Mas testes realizados pelo Greenpeace Alemanha mostram que o uso abusivo destes produtos, apoiado na liberação “à jato” de centenas de novos produtos, está contaminando também os mercados internacionais. Os testes indicaram a presença de 35 diferentes ingredientes ativos em frutas exportadas para a Europa, sendo 11 deles não autorizados no continente.
O Greenpeace Alemanha testou as frutas importadas do Brasil, com resultados bastante alarmantes. Foram testadas 70 amostras, que incluíam manga, limão, mamão papaia, melão e figo. Todas elas adquiridas em estabelecimentos de varejo (hard discount, mercados, supermercados e hipermercados: Aldi-Nord, Aldi-Süd, Lidl, Edeka, famila, HIT, Rewe, FrischeParadies) e em mercados de atacado nas cidades de Hamburgo, Colonia, Leipzig e Stuttgart. Destas, 59 amostras continham resíduos de agrotóxicos.
Em 64% das amostras foram encontrados mais de um agrotóxico, ou seja, muitas das amostras continham um coquetel de substâncias. A presença de mais de um agrotóxico nos alimentos agrega uma preocupação adicional para a saúde das pessoas por conta do chamado “efeito coquetel”, ou seja, efeitos distintos na saúde ocasionada por substâncias diferentes, além da possibilidade de interação entre os produtos, gerando efeitos que não são investigados pelas autoridades durante o pedido de registro.
O mamão foi o produto que mais apresentou esse tipo de contaminação múltipla. Uma das amostras apresentou nove agrotóxicos diferentes. Nas mangas essa realidade foi parecida, em uma das amostras foram encontradas quatro diferentes substâncias. Do total das 21 amostras de limões, 14 delas apresentaram sete tipos de resíduos diferentes.
Dentre os ingredientes ativos encontrados, 21 são considerados pela classificação da organização internacional Pesticides Action Network (PAN) como altamente perigosos (do inglês Highly Hazardous Pesticides – HHP), em função dos danos crônicos ou agudos que essas substâncias podem causar para a saúde humana ou meio ambiente, baseada nas evidências científicas.
Parte dos agrotóxicos encontrados nesses testes são produzidos pelas empresas Bayer e Basf, e são aprovados no Brasil, embora seu uso seja proibido no país de origem das duas empresas (Alemanha).
“Isso se chama “duplo padrão” de segurança e esse estudo reforça um dos alertas que fazemos há anos. O Brasil virou um país de segunda classe, com cidadãos de segunda classe, já que aqui é depositado uma série de substâncias que não podem mais ser vendidas nos seus próprios países de origem”, afirma Marina Lacôrte, da campanha de Agricultura e Alimentação do Greenpeace Brasil. “O que vivemos hoje é uma escolha e não é nossa. É dos governos e das empresas que se retroalimentam. Uma decisão que não envolve saúde, não envolve acesso e não envolve o que é melhor para a população, mas sim o que é bom para quem está nesse jogo, lucrando com isso”.
O tema vem sendo denunciado pelo Greenpeace Brasil desde 2015. Em 2016 e 2017 o Greenpeace Brasil realizou testes em diversos alimentos vendidos por aqui, e descobrimos que mais da metade das cinquenta amostras continham resíduos de agrotóxicos, inclusive de substâncias proibidas para determinados alimentos e pesticidas acima do limite permitido por lei.
Alimentos processados também estão contaminados
Os resíduos de agrotóxicos permanecem nos alimentos mesmo depois de serem intensamente processados e misturados a outros ingredientes, é o que aponta testes realizados pelo Instituto em Defesa do Consumidor (IDEC), que descobriu que diversos ultraprocessados consumidos pelos brasileiros também contêm agrotóxicos.
Afinal, como dizia o pai da química, Antoine Laurent Lavoisier, na natureza “nada se perde, tudo se transforma”. Para os testes, foram escolhidos produtos ultraprocessados consumidos pela população brasileira com maiores teores de açúcar, trigo, milho e soja na formulação, além de produtos com apelo para o público infantil e produtos com apelo à saúde. Do total analisado, 59% apresentaram pelo menos um tipo de agrotóxicos, mais de 50% dos produtos continham resíduos do conhecido e problemático glifosato ou de um outro herbicida chamado glufosinato. Na bolacha água e sal, amplamente consumida no Brasil, foram encontrados resíduos de sete tipos de agrotóxicos. Esse ultraprocessado é muitas vezes oferecido na merenda escolar para as crianças de escolas públicas.
Dentre os ingredientes ativos encontrados nos produtos estão: Carbendazim, Carbendazim (MBC) e benomil, Cialotrina-Lambda, Cipermetrina, Clorpirifós, Clorpirifós-metílico, Bifentrina, Deltametrina, Fenitrotiona, Glifosato, Glufosinato, Malationa e Pirimifós-metílico.
É sabido que produtos processados contêm quantidades excessivas e nocivas de açúcar, sal e gorduras, além de aditivos alimentares, e estão intimamente relacionados à doenças do coração, diabetes, cânceres, dentre outras doenças crônicas. Além disso, por terem sua produção baseada em ingredientes oriundos de commodities (isto é: monoculturas de soja, milho, trigo e açucar) e por esses cultivos serem altamente dependentes do uso intensivo de recursos naturais e agrotóxicos, que causam danos ao meio ambiente, suspeitava-se que também pudessem conter resíduos, o que ficou comprovado.
Os resíduos acrescentam uma camada a mais de riscos à saúde para quem consome estes produtos. O Glifosato, agrotóxico mais vendido no mundo, é considerado como “provavelmente” carcinogênico ou capaz de causar câncer”, de acordo com a IARC (Agência Internacional para Pesquisa sobre Câncer) da OMS (Organização Mundial da Saúde). O Glufosinato é considerado como tóxico para reprodução humana, pesquisas mostraram que a substância está relacionada à má formação embrionária e a problemas no sistema nervoso central em mamíferos.
Brasil envenenado
Ainda no fim de 2018, a ministra da Agricultura Tereza Cristina havia dito que o debate sobre agrotóxicos teria “muito espaço” em sua gestão. Não houve debate, mas o espaço para a aprovação de novos agrotóxicos ocupou a sala toda. Desde o início de sua gestão, 1.228 agrotóxicos foram aprovados no Brasil, segundo levantamento da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos, muitos destes proibidos no resto do mundo.
Além de extremamente nocivos à nossa saúde, os agrotóxicos comprometem também o meio ambiente e a segurança alimentar. Esse modelo de produção esgota os recursos e não é sustentável no longo prazo. Agrotóxicos são a base desses sistemas nocivos e que não serão capazes de fornecer alimentos de qualidade para todos e todas no longo prazo.
Enquanto enfrentamos a maior crise ecológica e sanitária de todos os tempos, a fome e a desigualdade voltam a crescer de forma descomunal. E o problema maior é que quem dita o curso das nossas leis e governa esse país tenta avançar por tudo quanto é lado por apenas um tipo de interesse, o próprio: eleitoral e financeiro.
“Quando você vota para eleger deputados e senadores, espera que trabalhem em defesa dos direitos da população, certo? Pois não é o que vemos. Existem grupos no Congresso Nacional que estão preocupados apenas em atender seus próprios interesses, ignorando seu dever de construir um Brasil mais democrático, justo e que respeite a diversidade”, alerta Marina.
A tão falada bancada ruralista, por exemplo, é um desses grupos. Formada por parlamentares que são grandes proprietários de terras e empresários rurais, ou que são apoiados por estes grupos. Estes parlamentares – junto à parte da indústria do agronegócio que os respalda e os apoia – insistem em perpetuar um modelo de ocupação do solo colonialista e que leva nossos recursos à exaustão.
Para se ter uma ideia, o Licenciamento Ambiental passou na Câmara num piscar de olhos, um projeto de gravidade extrema. E enquanto tentam no Senado um acordo para levar adiante esta atrocidade, ruralistas avançam na Câmara com outros projetos que beneficiam apenas eles mesmos, como o da grilagem, da exploração de Terras Indígenas, e a PL dos Agrotóxicos – sim o PL do veneno quer voltar, ainda este semestre querem pautar todo esse pacote de destruição. Uma verdadeira tragédia.
O Brasil que queremos
Essa história de “veneno aqui, comida boa lá” precisa acabar. Não somos cidadãos de segunda classe, nem a lata de lixo do mundo, onde são depositados tóxicos banidos em seus países de origem. “A escolha de ser o celeiro do mundo é também a escolha de manter parte da nossa população invisível, é também de consumir uma enxurrada de agrotóxicos e de continuar destruindo e aquecendo o planeta. Nesse sentido, questionar o modelo alimentar, agrícola e socioeconômico é uma obrigação da sociedade civil”, diz Marina.
Há muito tempo o Greenpeace tem denunciado e alertado sobre a importância de mudarmos nossa matriz de produção de alimentos, que hoje na verdade, produz menos alimentos e mais mercadorias, e que é muito mais negócio do que Agro propriamente dito. E já existem soluções disponíveis para mudarmos esse jogo.
Os sistemas agrícolas de base ecológica (que são muitos) têm enorme capacidade de aliviar os impactos pesados das mudanças climáticas e da perda de biodiversidade, e claro, de garantir a segurança alimentar e nutricional, e acabar com a fome. Atualmente, cerca de metade da população do país sofre com a insegurança alimentar, isto é, não tem acesso pleno à alimentação, e ao menos 19 milhões de brasileiros sofrem com a insegurança alimentar grave (nome técnico da FOME).
Fazer escolhas no campo individual é fundamental na transformação coletiva, mas é preciso ir além. Para conter essa agenda destrutiva é preciso pressionar deputados e senadores para que sigam o caminho de respeito aos direitos à vida e à saúde das pessoas. É urgente Implementar medidas efetivas para a redução da utilização de agrotóxicos, conforme preconiza o PL 6670 de 2016, que institui a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNARA), e não o contrário, como preconiza o PL 6299/2002. É preciso Implementar medidas efetivas para estimular a produção e o consumo de alimentos orgânicos e agroecológicos
Escreva para o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, e pressione para que ele não paute esses no plenário da Casa projetos que causarão atraso tremendo à sociedade, como o de “regularização fundiária” ou grilagem, abertura de terras indígenas e o pacote do veneno. Afinal, a prioridade agora é o combate à Covid-19, à fome e aos tristes impactos que a pandemia tem causado a população brasileira.
Fome no Brasil: chegou a hora de doar para quem precisa. Em maio de 2021, o Greenpeace Brasil e organizações parceiras iniciaram a campanha “Comida para quem precisa de comida de verdade” com o objetivo de doar e promover alimentos agroecológicos. Na primeira fase da campanha foram entregues mais de 14 mil quilos de alimentos, ajudando mais de 800 famílias. Mas, infelizmente, a realidade continua sendo intragável e essa corrente do bem precisa continuar. Clique aqui e participe!
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Discussão
Este assunto sobre agrotóxicos deve ser amplamente divulgado, discutido,a população desconhece o real perigo a que estamos sendo submetidos. Paralelo a isso, os alimentos geneticamente modificados também devem entrar nessa discussão, para que a sociedade tenha consciência da tragédia que está ocorrendo silenciosamente,e o risco de nosso futuro nossa saúde e agricultura vem sofrendo, com o aval de uma imprensa despreocupada e tendenciosa.
Este assunto sobre agrotóxicos deve ser amplamente divulgado, discutido,a população desconhece o real perigo a que estamos sendo submetidos. Paralelo a isso, os alimentos geneticamente modificados também devem entrar nessa discussão, para que a sociedade tenha consciência da tragédia que está ocorrendo silenciosamente,e o risco de nosso futuro nossa saúde e agricultura vem sofrendo, com o aval de uma imprensa despreocupada e tendenciosa.