Mobilização em Roraima contra a PEC 48 reúne milhares e já dura mais de vinte dias 

Nas faixas o repúdio contra a violação dos direitos originários. Crédito: Amarildo WaiWai/ CIR.

Mais de mil lideranças indígenas, de diferentes povos de Roraima, estão reunidos há 24 dias em um acampamento de resistência contra a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 48/2024, que insere a tese do Marco Temporal na Constituição Federal. Os bloqueios e mobilizações acontecem desde o dia 29 de outubro, após uma mobilização nacional articulada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) na mesma data. O bloqueio está próximo das Terras Indígenas São Marcos, na BR-174, Raposa Serra do Sol, na BR-401 e Tabalascada, na BR-432. Além disso, há protestos sendo realizados na Comunidade Indígena Sabiá, na TI São Marcos, e também na Comunidade do Jacarezinho, na TI Raposa Serra do Sol.

A PEC, de autoria do senador Hiran Gonçalves (PP/RR), é vista como um ataque direto aos direitos indígenas, ao propor que só teriam direito às terras aquelas comunidades que estivessem em posse delas na data da promulgação da Constituição – 5 de outubro de 1988. Essa tese ignora o histórico de expulsão violenta sofrido pelos povos originários ao longo dos séculos, e quer “desconstitucionalizar” direitos garantidos.

A mobilização se intensificou com a recusa do senador em dialogar com as lideranças indígenas, mesmo após convites formais enviados pelo Conselho Indígena de Roraima (CIR). Essa atitude foi recebida com indignação e repúdio, fortalecendo a decisão de manter os bloqueios até que haja disposição para ouvir as demandas. O CIR destaca que o movimento não é apenas uma reação à PEC 48/2024, mas também uma resposta à constante violação dos direitos indígenas.

O porta-voz da Frente de Povos Indígenas do Greenpeace Brasil, Jorge Eduardo Dantas, denuncia que a PEC 48/2024 é um golpe contra os povos indígenas e contra a própria democracia. “Essa proposta legaliza e valida a violência histórica contra os povos indígenas e tenta apagar sua memória de resistência. Não estamos falando apenas de direitos territoriais, mas de direitos humanos fundamentais. Além disso, os povos estão ameaçados por um pacote Anti-Indígena, que inclui Propostas de Emenda à Constituição (PECs) e Projetos de Lei (PLs) que querem desmantelar os direitos conquistados ao longo de décadas, ameaçando a convivência que existe entre os povos indígenas e a natureza dentro de suas terras”.

Pressão contra manifestações

O Ministério Público de Roraima instaurou um procedimento administrativo contra o bloqueio indígena, alegando prejuízos à população local, baseando-se no princípio da liberdade de locomoção. Mas, segundo informações do CIR, os atos têm sido marcados pela pacificidade e responsabilidade, com bloqueios realizados a cada seis horas. Durante os bloqueios, apenas veículos de emergência ou da polícia são autorizados a passar, garantindo que serviços essenciais não sejam prejudicados.

Além dos bloqueios, as manifestações incluem cantos, danças tradicionais e a participação ativa de jovens, professores, agentes de saúde e membros dos Grupos de Proteção e Vigilância Territorial Indígena (GPVIT). Esses atos expressam a força coletiva das comunidades e sua resistência histórica diante das tentativas de apagamento e violência institucionalizadas.

Em reportagem da Revista Cenarium, Edinho Macuxi, tuxaua-geral do CIR, ressaltou que a luta é contra os retrocessos nos direitos indígenas já conquistados ao longo dos anos. “Não queríamos estar aqui, mas estão fazendo retrocessos com nossos direitos, aprovando a lei 14.701 e criando a PEC 48. Portanto vamos continuar as manifestações nas regiões e cada vez mais fortalecidos. Aqui na BR tem a juventude, mulheres e crianças, que se sentem muito ameaçados em questão do nosso território, liberdade e dignidade. Todos estão aqui para dizer não ao Marco Temporal”

De acordo com o CIR, cartas foram enviadas à bancada de parlamentares de Roraima no Congresso Nacional, aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e ao governo federal, pedindo que se reúnam com os indígenas na comunidade Sabiá. Nesta quinta-feira, 21, os deputados federais Stélio Denner (Republicanos/RR) e Duda Ramos (MDB/RR) participaram de uma reunião com o movimento indígena. Lideranças de diversas regiões reiteraram sua oposição às PECs 48 e 36, pediram a suspensão da Lei 14.701 e cobraram posicionamento sobre o Marco Temporal, além de reforçarem o pedido de arquivamento da PEC e a presença do senador Hiran Gonçalves.

Durante o encontro, Duda Ramos classificou a defesa do Marco Temporal como desumana, enquanto Stélio Denner reafirmou seu compromisso de continuar votando contra medidas que violam os direitos indígenas. A resistência segue firme, com as comunidades demonstrando resistência contra os ataques aos seus direitos.

A luta pelo direito à terra, à vida e à dignidade está sendo travada não apenas nas rodovias de Roraima, mas também nos bastidores de um Congresso Nacional que insiste em virar as costas para os povos originários. Enquanto o diálogo não acontece, a voz da resistência ecoa, mais forte do que nunca, nos cantos, danças e palavras de ordem dessas comunidades. Para apoiar essa luta, assine a nossa petição ‘Marco Temporal Não” e nos ajude a pressionar pela derrubada da Lei 14.701 e da PEC48.

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