Movimento indígena vai questionar a decisão no Supremo Tribunal Federal

O Projeto de Lei 2903 contém dispositivos que ameaçam gravemente a existência dos povos indígenas © Levi Tapuia / Greenpeace

Em sessão conjunta realizada hoje (14), a Câmara dos Deputados e o Senado Federal derrubaram os vetos presidenciais ao Projeto de Lei 2903/2023, que trata do Marco Temporal. O PL também legaliza diversos crimes contra os povos indígenas do Brasil.  

Esse gesto é mais um capítulo da longa novela em que o agronegócio busca expandir seus domínios sobre as terras indígenas – tentando mais uma vez limitar o direito originário dos povos indígenas sobre seus territórios tradicionais e continuar lucrando com a destruição do planeta.  

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), a maior entidade representativa dos povos originários, já informou que vai entrar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo a declaração de inconstitucionalidade da lei. 

Entenda

O Projeto de Lei (PL) 2903/23, apresentado pelo ex-deputado Homero Pereira (MT), foi aprovado pelo Senado em setembro e seguiu para sanção presidencial. Ao chegar ao presidente, Lula vetou 47 dispositivos do projeto de lei.

Um dos dispositivos mais insensatos era o que falava do Marco Temporal – uma tese jurídica absurda que diz que terras indígenas só poderão ser consideradas como tal se, em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, indígenas estivessem ocupando aquele território. Essa tese, criada e divulgada pelo agronegócio, ignora de propósito os povos que foram exterminados ou que foram expulsos de suas terras em processos violentíssimos, que envolveram massacres, genocídios, escravização, violências sexuais e contaminação por doenças. Além disso, o próprio texto constitucional diz que os direitos indígenas são “direitos originários” e que, portanto, é impossível delimitar um prazo específico de tempo para quando esses direitos começam. 

Na discussão feita nesta quinta-feira, os parlamentares mantiveram os vetos presidenciais em pouquíssimos pontos – um que tratava de ameaças a povos indígenas isolados; outro que pretendia autorizar a plantação de transgênicos dentro de Terras Indígenas e outro, de teor racista, que falava sobre alteração de traços culturais. Eles foram excluídos do PL 2903.

Free Land Camp 2023 in Brasilia, Brazil. © Tuane Fernandes / Greenpeace
A ofensiva ruralista contra os direitos indígenas continua no Congresso Nacional. Movimento indígena promete manter a luta e resistência © Tuane Fernandes / Greenpeace

Lucros ruralistas

Ao derrubar os outros vetos de Lula, no entanto, os deputados e senadores mostram de novo que estão mais preocupados em continuar garantindo os lucros dos ruralistas do que defender a vida dos povos indígenas, de resguardar a nossa biodiversidade e manter as nossas florestas em pé – que é uma das medidas mais eficazes de combater a crise climática que enfrentamos hoje.

Com esse gesto, o agronegócio e seus representantes também afrontam a decisão tomada pelo STF em setembro, quando os ministros da Suprema Corte julgaram que a tese do Marco Temporal é inconstitucional.  

A expansão do agronegócio está na raiz de todas as manobras legislativas para inviabilizar o reconhecimento e demarcação das terras indígenas do Brasil. Para piorar, os ruralistas sequer disfarçam o desejo de abrir as terras indígenas já demarcadas ao monocultivo de grãos e a outras atividades incapazes de conviver com as florestas. 

Proteger biodiversidade

As Terras Indígenas precisam ser defendidas por todo o mundo. Esses territórios são, comprovadamente, aqueles que melhor protegem as nossas florestas e a biodiversidade. Nos últimos 30 anos, apenas 1,6% de todo o desmatamento registrado no Brasil ocorreu nesses lugares. A Organização das Nações Unidas (ONU) já atestou, também, que os territórios indígenas “guardam” 80% da biodiversidade de toda a Terra.

Em 2023, o Brasil experimentou ondas de calor, secas, chuvas e enchentes sem precedentes. A crise climática já está impactando milhões de pessoas, principalmente as mais vulneráveis. A expansão do agronegócio às custas dos direitos e da vida dos povos indígenas é uma ameaça a todos nós.

É fundamental que os direitos indígenas sejam respeitados, e seus territórios, protegidos. Precisamos seguir lutando por uma nova economia capaz de conviver com a floresta, respeitar os direitos humanos e superar a desigualdade social. Precisamos nos manter firmes na defesa do futuro desta e das próximas gerações!

Foto de indígenas no Acampamento Terra Livre em 2023 segurando o banner ''A resposta somos nós!''
A contribuição dos povos indígenas no combate à crise climática já é reconhecido pela Ciência © Tuane Fernandes / Greenpeace

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