Minuta de Lei Complementar apresentada na Reunião de Conciliação impõe retrocessos, e quer liberar exploração econômica em Terras Indígenas

O Greenpeace Brasil vê com grande preocupação os desdobramentos finais da mesa de conciliação que discute o Marco Temporal no Supremo Tribunal Federal (STF). As propostas compiladas na minuta proposta pelo Ministro Gilmar Mendes no dia 14 de fevereiro, se analisadas conjuntamente, configuram um dos maiores ataques aos direitos indígenas da história de nosso país e ameaçam de maneira gravíssima nossas florestas, nossos povos originários e nosso patrimônio natural.
As propostas, que ainda serão votadas na Comissão e dificilmente consensuadas, abrangem medidas como a possibilidade de se desenvolver projetos de mineração dentro de Terras Indígenas, mesmo sem concordância dos povos afetados; a realização de obras de infraestrutura como rodovias e linhas de transmissão com consulta, mas sem direito a veto por parte dos povos impactados; e a possibilidade de desenvolvimento de atividades econômicas como agropecuária dentro das Terras Indígenas. A fragilização da consulta livre, prévia e informada e a criminalização das retomadas também estão em questão.
Além disso, entre as propostas apresentadas no texto sendo discutidas estão a indenização de proprietários não indígenas que possuam títulos de propriedade dentro de territórios originários antes de 1988 (com possibilidade de pagamento com dinheiro ou terras, trazendo um impacto financeiro enorme ao processo); e novas etapas para o processo de demarcação de territórios originários, que poderiam deixar o processo mais lento e difícil. Até mesmo a reabertura sobre o redimensionamento de territórios já demarcados é citado na nova minuta proposta pelo Ministro Gilmar Mendes.
Ao se examinar o contexto mais amplo a nova proposta levada à mesa de conciliação, chega-se à conclusão de que o resultado extrapola o objeto das ações judiciais e dos temas debatidos na Comissão e tem como objetivo final abrir os territórios originários para a exploração econômica – colocando em risco a manutenção da vida na terra, o equilíbrio climático do planeta e a construção de um futuro justo, ecológico e sustentável para todos. Entendemos que essas providências não só não violam os direitos dos povos originários; como também ameaçam de maneira muito séria nossos rios e florestas – os passaportes para o nosso futuro.
Promulgada às pressas no final de 2023, a Lei 14.701, a Lei do Marco Temporal, representa um dos maiores retrocessos na proteção dos territórios indígenas já registrados no Brasil. É por isso que o movimento indígena, assim como o Greenpeace Brasil, que atua como amicus curiae no processo, pede pela suspensão dessa Lei, demanda que não foi atendida pelo Ministro Gilmar Mendes.
Da maneira como está posta, a proposta trazida pelo gabinete do Ministro beneficia apenas setores econômicos que lucram com a degradação dos biomas e com a expulsão de comunidades indígenas e populações tradicionais de suas terras. Vale lembrar que a possibilidade de mineração dentro de Terras Indígenas não consta na Lei 14.701 e sequer foi discutida nas mais de 17 sessões feitas pela comissão desde o ano passado.
Igualmente, é importante ressaltar que a tentativa de conciliação promovida pelo STF para discutir a Lei do Marco Temporal tem sido marcada por assimetrias e procedimentos que colocam os interesses do agronegócio e da exploração econômica acima dos direitos indígenas. A saída da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) da mesa de conciliação, ocorrida em agosto de 2024, evidenciou a fragilidade desse processo, que se iniciou com violências simbólicas e práticas discriminatórias.
A abertura das Terras Indígenas para a exploração econômica e mineração causará danos irreparáveis aos povos indígenas, sua cultura e seus modos de vida. Além disso, a atividade mineradora carrega outras consequências para o meio ambiente, como o desmatamento, a contaminação dos recursos hídricos, do solo, da floresta e o risco de acidentes socioambientais. As tragédias de Mariana e Brumadinho revelam o passivo ambiental incalculável deixado pelas mineradoras, com processos falhos de reparação e reconstrução.
As Terras Indígenas desempenham um papel essencial no combate às mudanças climáticas, atuando como barreiras naturais contra o desmatamento e sequestrando grandes quantidades de carbono da atmosfera. Em um contexto de crise climática severa, ignorar a importância desses territórios e colocá-los a serviço do capital significa acelerar o colapso ambiental que vivemos e aprofundar as desigualdades sociais.
O Greenpeace Brasil, como aliado histórico do movimento indígena, reafirma seu compromisso com a defesa dos povos originários, de sua autonomia e de seus territórios. A luta contra os retrocessos dos direitos indígenas e seus territórios é uma luta pela justiça, pelos direitos humanos e pela manutenção da vida no planeta.
Da mesma maneira, juntamente com outras organizações que trabalham na defesa dos povos indígenas, dos direitos humanos e da democracia, apelamos ao Supremo Tribunal Federal (STF) para que reconheça possíveis falhas e equívocos no processo dessa mesa conciliatória, bem como a ausência de consenso sobre os temas propostos, e faça as devidas correções de rota necessárias. O STF precisa confirmar seu importante papel de Corte Constitucional fazendo valer os direitos e garantias fundamentais dos povos indígenas descritos no artigo 231 da CF/88. Ainda não é tarde para salvar os territórios indígenas – e a hora de agir contra a crise climática e a favor dos povos originários é agora. Assine nossa petição “Marco Temporal Não” e faça a diferença!
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