A produção que enxerga a natureza como aliada, é justa para quem planta e para quem consome, é também um caminho inescapável para conter os impactos das mudanças do clima
O recado da ciência está dado, e não é de hoje. A crise climática não é mais uma ameaça futura e estamos vivendo uma última janela de oportunidades para a tomada de ação em direção a uma mudança urgente e necessária no modo de funcionar da humanidade.
Este foi um dos importantes alertas do mais recente relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), que revelou que “é inequívoco que a influência humana aqueceu a atmosfera, o oceano e a terra”. E o que importa agora? O que importa é olharmos para o que está errado, para as soluções que já existem, entendermos o que nos trouxe até aqui e para onde precisamos ir a partir de agora.
E é sobre uma dessas soluções que vamos tratar: a agroecologia como alternativa ao atual modelo hegemônico de produção e consumo de alimentos (baseado em monocultivos e uso de agrotóxicos) e como uma forma de cultivo com maior capacidade de sobreviver a pressões externas como as mudanças climáticas que provocam a crise hídrica nos estados do Centro-Sul. Há 91 anos não se via níveis tão baixos de água nos reservatórios do país, e a falta de chuvas gerou uma série de consequências que se unem a problemas de gestão e, no final das contas, pesam no bolso e no prato dos brasileiros, como a alta da conta de luz e do preço dos alimentos.
Os cientistas já alertaram também para o fato da agricultura ser considerada um dos setores mais vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas. E as previsões se concretizaram. Hoje a crise climática bate à porta do campo e já impacta a produção do arroz e feijão do brasileiro. Ao mesmo tempo que é responsável pelo uso de 70% da água retirada de rios, lagos e aquíferos para irrigação, como a agricultura tem cuidado desse recurso tão essencial à vida e inclusive à própria sobrevivência da produção?
Para Flávio Bertin Gandara, professor de Ecologia da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ), da Universidade de São Paulo, as diferentes formas de produção se relacionam de modos muito diversos com recursos naturais como a água. “A agricultura irrigada é, de longe, a atividade humana que mais gasta água no mundo e no Brasil. Já a agroecologia tem como premissa o uso racional dos recursos naturais, incluindo a água. Ela se utiliza também da irrigação, mas procura empregar métodos que desperdicem menos este recurso, além de usar espécies e variedades que sejam mais adaptadas às condições ambientais, necessitando assim de menos irrigação”, explica.
Na agroecologia, a água é considerada um bem público, o que garante uma lida completamente diferente daquela que rege a lógica exploradora do agronegócio pautada na economia do desmatamento; e por ser uma forma de produção de alimento consorciada com a natureza, ela inclusive contribui para o rebrotamento de nascentes. Alguns sistemas agroecológicos, como a agrofloresta, consistem justamente em plantar floresta e comida a um só tempo, resultando em mais água nos sistemas.
Quer saber mais sobre os benefícios da agroecologia e a urgência de fazermos uma transição de um modo de produção e consumo baseado na destruição e no lucro para um que considere a natureza como aliada? Então pegue uma cadeira, uma pitada de curiosidade e dê uma espiada nessa conversa cheia de soluções que fizemos com o professor Gandara. As soluções já existem, já estão sendo colocadas em prática, só precisam ganhar incentivo e escala para que toda forma de vida seja beneficiada.
Nessa primeira parte da entrevista, saiba como a agroecologia pode, inclusive, contribuir com a absorção de gás carbônico da atmosfera.
Estamos falando aqui sobre duas formas de produção do nosso alimento: de um lado, a agroecologia, que nasce principalmente pelas mãos da agricultura familiar, que mantém a água viva em todos os seus ciclos e considera os limites dos recursos naturais. E do outro, uma agricultura que ameaça o próprio recurso do qual depende para garantir sua produtividade, além de colocar todas as formas de vida em risco ao contaminar os lençóis d´água, destruir nossas florestas e biodiversidade, e não considerar o conhecimento milenar dos pequenos agricultores. Em plena crise do clima, está fácil de ver qual delas não se sustenta mais se a nossa escolha for pela saúde do planeta.
Nesta segunda parte da conversa, saiba algumas diferenças entre os grandes monocultivos e o sistema de produção agroecológico.
Por último, o professor Flávio Gandara responde à pergunta: as plantações cultivadas no sistema agroecológico podem ser mais resilientes do que o monocultivo na hora de enfrentar momentos de crise como este que estamos vivendo de falta de chuvas e seca intensa? E fomos um pouco mais além, perguntamos também se a agroecologia pode ser encarada como uma alternativa de adaptação às mudanças climáticas.
Além de responder a essas perguntas, ele conta sobre um estudo que mostra como agricultoras e agricultores familiares do Semiárido brasileiro sustentam seu cultivo nos princípios agroecológicos enquanto lidam com as situações climáticas adversas da região. Um conhecimento que pode dar pistas importantes sobre formas de produção de alimento que apresentam maior resiliência frente às adversidades climáticas que seguem se agravando em todo o território nacional.
Depois dessa conversa, não há mais dúvidas de que precisamos colorir o campo e o nosso prato, garantir a floresta em pé, valorizar o conhecimento tradicional, e fortalecer uma produção que considere os limites dos recursos naturais, que valorize a diversidade e a cultura alimentar de cada região e que gere saúde para todas as formas de vida.
Já existem soluções para a crise climática que podem contribuir com a resolução da crise econômica e social brasileira. Precisamos apenas ligar os pontos, contar com quem já está atuando e promover ações que contribuam para a construção de um mundo mais justo, inclusivo e em equilíbrio com os recursos naturais do planeta. Assine a nossa petição para se juntar ao movimento de pessoas que reconhecem a urgência da crise climática e manter-se informade sobre mobilizações e iniciativas para pressionar as autoridades.
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