Recentes declarações de membros do governo a favor da exploração ignoram recomendações da equipe técnica do Ibama; Greenpeace alerta que abrir uma nova fronteira de petróleo na Amazônia resultará em um projeto econômico insustentável, ultrapassado e socialmente excludente.

O veleiro Witness, do Greenpeace, realizou a Expedição Costa Amazônica Viva para documentar os potenciais impactos da exploração de petróleo na costa amazônica. A região abriga uma biodiversidade única, incluindo o Grande Sistema de Recifes da Amazônia e vastos manguezais, que são essenciais para as comunidades locais em termos de alimentação e renda. No entanto, a indústria petrolífera está avançando sobre a área, com projetos como o bloco FZA-M-59, localizado na Bacia da Foz do Amazonas. Enrico Marone / Greenpeace
O Greenpeace Brasil acompanha com preocupação as recentes declarações do presidente Lula e do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, pressionando pela licença para a exploração de petróleo na Foz do Amazonas. Embora essa seja uma decisão política, ignorar avaliações técnicas sobre a sensibilidade ambiental da região, a dinâmica das águas na Margem Equatorial e o modo de vida das comunidades locais é irresponsável. Mais que isso, em um cenário de emergência climática como o atual, a abertura de novos poços de petróleo contradiz os compromissos do próprio país com a transição energética e apenas reforça padrões excludentes, insustentáveis e ambientalmente predatórios.
“O Brasil tem condições para liderar os esforços globais para uma transição energética justa e, com isso, desfrutar dos ganhos que essa transformação pode produzir, mas, como tem nos mostrado os eventos extremos, o mundo tem uma janela curta para agir, de modo que não é mais aceitável que os países continuem a investir na exploração de combustíveis fósseis, sobretudo em áreas tão vulneráveis como a Margem Equatorial”, afirma o porta-voz de Transição Energética do Greenpeace Brasil, Rárisson Sampaio.
“Em pleno 2025, no ano em que sediará a COP30, o Brasil deveria estar preocupado em acelerar medidas para diminuir a demanda interna por petróleo e implementar os marcos regulatórios que impulsionam a transição energética nacional, respeitando os direitos de comunidades em seus territórios e assegurando a proteção dos ecossistemas”, completa Sampaio.
Além de não considerar o atual cenário de crise climática – agravada justamente pela extração e queima de combustíveis fósseis -, as declarações do presidente Lula e do ministro Silveira tentam reduzir barreiras técnicas e contornar resistências sociais de maneira apressada e sem a precaução necessária para proteção da região costeira Amazônica, ignorando as recomendações da equipe técnica do Ibama e deixando de lado o direito de consulta livre, prévia e informada das comunidades locais.
“A fala do Presidente Lula ao recém-eleito presidente do Senado, Senador Davi Alcolumbre, por exemplo, de que o governo irá ‘destravar’ a licença o quanto antes é, no mínimo, indevida, por tratar a questão das perfurações na Foz do Amazonas apenas como mais um passo burocrático em sua gestão. Além disso, querer apressar a licença de autorização para a perfuração com o objetivo de distanciá-la da COP30 soa como uma manipulação da opinião pública e pode ser interpretada como um greenwashing da política energética e climática nacional”.
“Se essa licença for aprovada, há um risco, inclusive, de se manchar a credibilidade do Brasil como presidente da COP-30”, completa o porta-voz.
Brasil pode repetir erros e perder oportunidades
O Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MIDR), em parceria com a Petrobrás, se articula para lançar um novo programa de desenvolvimento regional (Desenvolve Amazônia), com a promessa de direcionar investimentos e recursos para a região Amazônica.
Porém, ao apresentar a exploração do petróleo na bacia da Foz do Amazonas como um vetor de desenvolvimento econômico para a região, o governo repete o equívoco de associar a mera extração de recursos ao progresso regional. Sem o aprimoramento de instrumentos de governança e transparência, o direcionamento desses investimentos tende a ser ineficaz, comprometendo tanto os benefícios para a região, quanto a garantia de direitos para as comunidades locais.
Ignora-se o fato de que diversas comunidades locais estão sob o risco de terem os seus territórios e modos de vida diretamente impactados pelas externalidades do projeto. A FUNAI, inclusive, foi provocada a se manifestar sobre os fluxos de aeronaves e aumento dos ruídos sonoros sobre territórios indígenas situados na rota do projeto.
“Dado o histórico brasileiro, condicionar o desenvolvimento da região Amazônica à exploração de recursos naturais é equivocado. A exploração do pré-sal, por exemplo, não implicou no desenvolvimento de localidades beneficiadas pelos royalties da atividade. Pelo contrário, muitos destes municípios registraram uma redução no Índice de Desenvolvimento Humano. É preciso fortalecer as iniciativas locais de desenvolvimento das próprias comunidades, a partir de instrumentos financeiros apropriados e em harmonia com uma economia mais sustentável”, explica Sampaio.

Transição energética não precisa do dinheiro do petróleo
O Greenpeace Brasil também reforça que o argumento de que a transição energética será financiada com dinheiro do petróleo vai na contramão ao enfrentamento da emergência climática. Abandonar os combustíveis fósseis em um mundo fortemente dependente do petróleo não é tarefa simples, mas não se pode apenas decidir explorar qualquer área sem mensurar adequadamente os riscos e consequências associados.
“Ao prometer utilizar o dinheiro da exploração do petróleo para financiar a transição energética, o governo subverte a lógica de reduzir combustíveis fósseis para ampliar investimentos em fontes renováveis. O país precisa de uma diversificação de investimentos frente ao desenvolvimento de outras fontes energéticas, e que considere uma potencial desvalorização dos combustíveis fósseis em um futuro próximo. O Brasil tem alternativas mais eficientes e vantajosas para financiar o futuro, como a redução de subsídios e incentivos para projetos de óleo e gás no país”, pontua Sampaio.
Conforme defendeu o secretário executivo de Clima da ONU em visita ao Brasil na quarta-feira (5), Simon Stiell, a mudança do mundo para a energia limpa agora “é imparável” por causa da “colossal oportunidade econômica” que ela apresenta. Em um discurso no Itamaraty, o secretário executivo lembrou que, no ano passado, o investimento global em energias limpas foi o dobro do que o valor investido em combustíveis fósseis, porque “os investidores sabem que a energia limpa faz muito mais sentido. A oportunidade de ganhar dinheiro é simplesmente grande demais para ser ignorada”.
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