A iniciativa possibilitou realização de testes e uma clareza da situação da pandemia no território mais próximo ao município de Lábrea, o último da Transamazônica

“A gente vê que deu muito problema desse negócio de dor de garganta, febre, alguns não estavam sentindo cheiro, tudo isso a gente viu que já teve. Mas ninguém sabe se era mesmo (Covid-19)”, diz Luis Nogueira de Assis, agente indígena de saúde da comunidade Nova Esperança 2, Terra Indígena (TI) Caititu, município de Lábrea, Amazonas.

Luis é um dos muitos indígenas que convivem com a dificuldade de acesso a testes para identificação da Covid-19, o que tem sido uma realidade para muitos dos povos no interior da Amazônia. Em agosto, junto com outros Agentes Indígenas de Saúde (AIS) do povo Apurinã, ele participou de um treinamento de testagem realizado em Lábrea.

Localizada ao sul do Amazonas, às margens do Rio Purus, os únicos meios de se chegar a Lábrea são por barco, avião pequeno ou pela BR-230 (Transamazônica). E foi para lá que o projeto Asas da Emergência, uma rede de solidariedade da qual o Greenpeace faz parte, fez um dos voos no mês passado para transportar doações de ajuda emergencial para combate à Covid-19 e também levar profissionais saúde, dando suporte ao treinamento de testagem realizado no município nos dias 3 e 4 de agosto.

A iniciativa foi promovida por uma articulação local protagonizada por organizações indígenas e indigenistas que tem como objetivo planejar ações para contribuir com os povos originários da região no enfrentamento da pandemia. O treinamento para a aplicação de testes da Covid-19 foi uma dessas ações. 

A gente viu que os órgãos de representação do governo que atuam com os indígenas estavam com muitas dificuldades de acessar recursos, de fazer aquisições de materiais de suma importância para a proteção dos povos, principalmente daqueles que vivem próximos ao município. Dentro desse contexto, as instituições da região viram a necessidade de formar esse grupo de trabalho que desde então vem unindo esforços para contribuir com a proteção dos povos”,  explica Magno dos Santos, indigenista do programa Amazonas, da organização Operação Amazônia Nativa (Opan).

Participaram da oficina dez AIS, que são os indígenas que trabalham nas aldeias desenvolvendo ações de prevenção e promoção de saúde de seus parentes, e também profissionais de saúde que atuam no Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Médio Rio Purus, entre enfermeiros, técnicos de enfermagem e técnicos de laboratório.  

Durante o treinamento, todos receberam informações sobre como se prevenir do novo coronavírus, como lidar com pessoas que apresentam os sintomas e aprenderam a aplicar e a interpretar o resultado do teste rápido, que informa se o paciente teve ou não contato com o novo coronavírus, se está recuperado da doença ou se ainda está transmitindo.

Foi muito útil pra mim ter participado desse treinamento. É nosso papel cuidar da saúde do nosso povo. Além da visita domiciliar que a gente faz todos os dias, a gente acompanha as campanhas de vacinação nas aldeias, também faz acompanhamento dos idosos, dos hipertensos, das grávidas, das crianças, e agora quando eu voltar, eu vou fazer uma palestra pra passar pros moradores da minha aldeia o que eu aprendi aqui”, diz Raimundo Nonato Silva de Lima, do povo Apurinã e agente indígena de saúde da aldeia São José. 

Poucos dias após o treinamento, os profissionais de saúde viajaram para a Terra Indígena Caititu, que fica bem próxima à cidade de Lábrea, para aplicar os testes em alguns moradores do território.

Os AIS que participaram do treinamento ficaram responsáveis por fazer a articulação entre os moradores das aldeias e a equipe que ia fazer a testagem. Depois de passar pela primeira triagem, a pessoa que havia tido sintomas ou que pertencia ao grupo de risco era encaminhado para uma avaliação e para o teste rápido.

Entre 17 e 24 de agosto, os profissionais de saúde do Dsei que viajaram pelos rios da Terra Indígena Caititu para aplicar os testes, sob orientação dos AIS, testaram 253 dos 2 mil indígenas que moram na TI Caititu. Do total, 74 apresentaram resultado positivo para a Covid-19, mas apenas 15 estão ou estiveram infectados e podem estar transmitindo a doença. 

A gente avalia que, para além de identificar casos, ao fazermos uma amostragem dentro das 26 aldeias, podemos ter uma clareza da real situação da pandemia no território e posteriormente dar uma resposta para dentro do território sobre quais possíveis próximos passos. Uma oportunidade que pode ajudar a salvar vidas”, diz Magno dos Santos.

Os indígenas que atuam com saúde nas aldeias e todos os moradores do território ansiavam por essa clareza. “Se numa casa com seis pessoas, uma delas tiver sintomas e o teste der positivo, a gente já sabe que ali não foi só uma pessoa que pegou. E aí a gente tem que cuidar daquela família, isolar as pessoas e ficar atenta a todos os outros parentes na aldeia”, explica Elizete Pereira da Silva, AIS da aldeia Paxiuba, Polo Chico Camilo, uma das participantes do treinamento.

O grupo de trabalho que atua hoje localmente no município de Lábrea, estendendo suas ações para a TI Caititu, reúne Operação Amazônia Nativa (Opan), Federação das Organizações e Comunidades Indígenas do Médio Purus (Focimp), Conselho Missionário Indigenista (Cimi) do Médio Purus, Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), Fundação Nacional do Índio (Funai) e Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai). 

O Asas da Emergência também apoiou outras atividades como essa em demais municípios de regiões isoladas da Amazônia e em áreas de fronteira com Peru, Colômbia e Venezuela, nos municípios de Feijó (AC), Lábrea (AM), São Gabriel da Cachoeira (AM), Tabatinga , Jordão (AC) e Santa Rosa do Purus (AC).

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