Durante expedição de monitoramento nos limites da Terra Indígena Sawre Muybu, indígenas encontraram madeireiros ilegais na área que é parte de seu território e exigiram a saída dos invasores

Caminhão madeireiro é encontrado pelo povo Munduruku dentro de seu território

Caminhão madeireiro encontrado pelo povo Munduruku durante fiscalização dentro de seu território.

“Os invasores estão matando a nossa vida e derramando sangue da nossa floresta. A nossa vida está em perigo. Mas por isso, nós vamos continuar mostrando a nossa resistência e a nossa autonomia. Somos capazes de cuidar e proteger o nosso território para nossos filhos e as futuras gerações”, diz o comunicado do povo Mundururku divulgado após a conclusão da expedição que percorreu a pé cerca de 100 km dentro do território Daje Kapap Eipi, conhecido como Terra Indígena Sawre Muybu.

Lutando pela defesa da vida e da floresta, guerreiros e guerreiras do povo passaram os últimos 18 dias percorrendo o perímetro da terra indígena com o objetivo de fiscalizar o local e garantir a sua proteção. No caminho, encontraram madeireiros destruindo a floresta, além de muitas estradas abertas.

A expedição é parte da quinta etapa da autodemarcação realizada pelos Munduruku, que teve início em 2014 e consistiu na delimitação por conta própria dos limites da Terra Indígena (TI) Sawre Muybu, localizada no rio Tapajós, no Pará. Em 2016, o direito originário dos Munduruku a esse território foi reconhecido pelo Estado brasileiro a partir da publicação do Relatório de Identificação e Delimitação no Diário Oficial da União. No entanto, desde então, a conclusão do processo de demarcação está paralisada na burocracia estatal, especialmente em função dos planos de construção da hidrelétrica de São Luiz do Tapajós, que alagaria parte da TI e comprometeria a vida dos Munduruku no local.

Os Munduruku já realizaram diversos protestos pela demarcação e proteção de seu território. “Enquanto a demarcação não ocorre, o caminho fica aberto para a entrada de invasores que destroem a floresta e contaminam os rios, vitais para a sobrevivência do povo”, explica Danicley de Aguiar, da campanha de florestas do Greenpeace Brasil. Há anos as lideranças Munduruku estão denunciando a invasão e destruição do local, porém, apesar da Fundação Nacional do Índio (Funai) já ter reconhecido a ocupação tradicional da área pelo povo Munduruku, o Estado brasileiro continua de braços cruzados, permitindo que, especialmente garimpeiros e madeireiros, sigam pilhando o território, alterando o equilíbrio ambiental e impedindo que os Munduruku circulem livremente.

“Nós expulsamos dois grupos de madeireiros que invadiram o nosso território. Ficamos muito revoltados por ver as nossas árvores derrubadas e as nossas castanheiras como torra de madeira em cima de um caminhão. E nós sabemos que quando retiram madeira, vão querer transformar nossa terra em um grande pasto para criar gado. Por isso, demos um prazo de 3 dias para os invasores retirarem todo o equipamento deles. Nós estávamos armados com nossos cânticos, nossa pintura, nossas flechas e a sabedoria dos nossos antepassados”, diz o comunicado dos Munduruku.

“Além de injusta e inconstitucional, a morosidade do processo de reconhecimento, que já dura mais de uma década, é irresponsável e coloca em risco a sobrevivência de uma população de quase 1.000 indígenas, que faz uso direto das florestas e das águas do território, hoje contaminadas pela exploração de ouro, diamantes e madeira”, diz Danicley de Aguiar.

A demarcação é um direito constitucional garantido aos povos indígenas, no entanto, o presidente Jair Bolsonaro já afirmou que não vai mais homologar nenhuma terra indígena. Junto a isso, o presidente tem declarado sistematicamente a intenção de abrir esses territórios para a mineração e a exploração por empresas estrangeiras, o que acaba estimulando a invasão de terras indígenas na Amazônia.

Atualmente, milhares de indígenas estão em risco por defenderem a floresta frente à invasões de madeireiros, garimpeiros e grileiros. No último sábado (27), a Funai confirmou a morte do cacique Emyra Wajãpi próximo à aldeia Mariry, após a invasão de um grupo de garimpeiros na terra indígena, no Amapá.

É dever do Estado proteger os territórios indígenas e seus povos, coibindo atividades ilegais de garimpo e mineração para evitar a escalada de conflitos. É preciso reconhecer e apoiar o direito dos povos indígenas às suas florestas e especialmente o direito de viverem conforme seus costumes e tradições.

Como dizem os Munduruku em seu comunicado, “Será que vai precisar morrer outros parentes, como aconteceu com a liderança Wajãpi, para que os órgãos competentes atuem?”.

Não podemos permitir que a violência contra os povos indígenas continue! Apoie a luta dos povos indígenas

 

Leia a íntegra do comunicado dos Munduruku:

Comunicado dos Munduruku

A nossa autodemarcação e defesa do nosso território continua.Nós o povo Munduruku do Médio e Alto Tapajós continuamos a autodemarcação do nosso território Daje Kapap Eipi, conhecido como Terra Indígena Sawre Muybu. Nós andamos mais que 100 km no nosso território, na terra que já possui o Relatório Circunstancial de Identificação e Delimitação publicado no diário oficial desde abril de 2016. Organizados em 5 grupos– os guerreiros Pusuru Kao, Pukorao Pik Pik, Waremucu Pak Pak, Surup Surup e a guerreira Wakoborun– continuamos defendendo o nosso território sagrado. Assim sempre foi a nossa resistência. Como nossos antepassados sempre venciam as batalhas e nunca foram atingidos pelas flechas dos inimigos, nós também continuamos limpando os nosso picos, fiscalizando, formando grupos de vigilância e abrindo novas aldeais, como Karoebak no Rio Jamanxim.Durante essa quinta etapa da autodemarcação e nossa retomada, nós encontramos novas aberturas e vários ramais de madeireiros e palmiteiros dentro da nossa terra. Nós expulsamos dois grupos de madeireiros que invadiram o nosso território. Ficamos muito revoltados por ver as nossas árvores derrubadas e as nossas castanheiras como torra de madeira em cima de um caminhão. E nós sabemos que quando retiram madeira, vão querer transformar nossa terra em um grande pasto para criar gado. Por isso, demos um prazo de 3 dias para os invasores retirarem todo o equipamento deles. Nós estávamos armados com nossos cânticos, nossa pintura, nossas flechas e a sabedoria dos nossos antepassados. E com muita pressão, eles passaram a madrugada toda retirando 11 máquinas pesadas, 2 caminhões, 1 quadriciclo, 1 balsa e 8 motos. Todos sem placa. Na retomada, andamos 26 km vigiando os ramais que os madeireiros fizeram no nosso território e bebendo água suja do rio Jamanxim que está poluída pelo garimpo. Sozinhos conseguimos expulsar madeireiros que nem o ICMBIO, IBAMA e FUNAI conseguiram. E sabemos que dentro da Flona de Itaituba II, tem pista de pouso.Os invasores estão matando a nossa vida e derramando a sangue da nossa floresta. A nossa vida está em perigo. Mas por isso, nós vamos continuar mostrando a nossa resistência e a nossa autonomia. Somos capazes de cuidar e proteger o nosso território para nossos filhos e as futuras gerações. Ninguém vai fazer medo e ninguém vai impedir porque nós mandamos na nossa casa que é nosso território. Estamos aqui defendendo o que é nosso e não dos pariwat. Por isso sempre vamos continuar lutando pelas demarcações dos nossos territórios. Nunca vão nos derrubar. Nunca vamos negociar o que é sagrado.Será que vai precisar morrer outros parentes, como aconteceu com a liderança Wajãpi, para que os órgãos competentes atuem?

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