Em expedição do projeto Asas da Emergência, iniciamos a subida do Rio Solimões transportando quase 22 toneladas de ajuda emergencial para os povos indígenas da região

O barco do Asas Da Emergência está subindo o Rio Solimões, fazendo paradas nas cidades de Tefé, Uarini, Fonte Boa, Jutaí, Santo Antônio do Içá, São Paulo de Olivença, Benjamin Constant e Tabatinga. © Marcos Amend / Greenpeace

23 de agosto de 2020 – domingo, Baixo Solimões

Eram 20h12 quando nosso barco “Samara Lopes XII” deixou o Porto do São Raimundo, na área centro-sul de Manaus, e começou a descer o Rio Negro rumo ao Rio Solimões. Nosso destino final é a cidade de Tabatinga, na tríplice fronteira Brasil-Peru-Colômbia. Para percorrer os 1.607 km até lá, navegaremos oito dias e noites por esta caudalosa “estrada”. Afinal, como dizem os amazônidas: “os rios são nossas estradas”.  

E é justamente esta a nossa missão: transportar 21,3 toneladas de ajuda emergencial para povos indígenas que vivem na região do Médio e Alto Solimões, de modo que a disseminação da Covid-19 não cause ainda mais impactos em suas comunidades, tirando abruptamente a vida de anciãos, crianças e tantos “parentes” Amazônia afora.

Nesta expedição do projeto Asas da Emergência, atracaremos nas cidades de Tefé, Uarini, Fonte Boa, Jutaí, Santo Antônio do Içá, São Paulo de Olivença, Benjamin Constant e, por último, Tabatinga. Foi justamente nesta região (mais precisamente em Santo Antônio) que foi detectado o primeiro caso de contaminação de um indígena pelo coronavírus. Desde esse primeiro registro feito no dia 25 de março, pelo povo Kokama, da Aldeia São José, mais de 27 mil indígenas já foram contaminados, de 155 povos, e 717  indígenas perderam suas vidas devido a essa doença, segundo dados da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). Cerca de 80% dessas mortes ocorreram na Amazônia. 

Solidários à luta dos povos indígenas para sobreviverem diante desse cenário adverso, uma parte substancial da carga que entregaremos nesses oito portos será utilizada para a montagem das Unidades de Atenção Primária Indígena (Uapi). Essas são enfermarias de campanha para o tratamento de casos de baixa e média complexidade, que evitam, por exemplo, que os indígenas se exponham a mais riscos nas cidades.

O volume da entrega contém 79 concentradores de oxigênio, três geradores, dois sistemas de rádio para comunicação (com antenas, placas solares, baterias e controladores), 10 mil máscaras de tecido e 6.300 cartilhas da Unicef sobre prevenção da Covid-19, além de equipamentos de proteção individual, kits de oxigênio e milhares de barras de sabão, de sabonetes, de frascos de detergente, desinfetante e álcool em gel.

Lua de fogo

Na noite de sábado, uma fina lua cintilava no céu da floresta. No início da sua fase crescente, ela, surpreendentemente, se apresentava vermelha e não prateada. Wayne, um de meus colegas a bordo, contou que essa peculiar beleza é, na realidade, muito preocupante. “A lua fica vermelha assim por causa das queimadas, do fogo que já consumiu milhares de hectares da Amazônia nas últimas semanas”. 

Passei um bom tempo na rede, tentando dormir. Em plena floresta amazônica, diante de tamanha abundância de água e biodiversidade, eu me sentia profundamente agradecida por estar ali. Esse sentimento tornava ainda mais difícil compreender a escolha por um modelo de sociedade que prioriza o lucro acima da vida. Também é inaceitável pensar que os povos indígenas que, ao longo dos séculos, defenderam a Amazônia – que é o maior patrimônio ambiental do mundo –  estejam abandonados em um momento tão drástico como o que essa pandemia representa. 

Observando aquela quantidade infinita de estrelas adormeci com a convicção de que estar ao lado dos povos originários, das comunidades tradicionais e na defesa da vida – do modo que for possível -, é uma das missões mais essenciais que podemos assumir. Por nós mesmos, pelas nossas famílias e por todas as pessoas e seres que amamos.


Embarque nessa jornada! Acompanhe o segundo e terceiro dia da expedição do Asas da Emergência.

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